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TerçOLHO

Este é um espaço dedicado às imagens e às tensões textuais. O resto é pura neurastenia.

TerçOLHO

Este é um espaço dedicado às imagens e às tensões textuais. O resto é pura neurastenia.

31
Out06

Abanar o pavão

João Madureira
2004_071420040012.JPG
Não sei se é uma questão de posição, de oposição ou de afirmação?
Pode ser, muito simplesmente, uma questão de tensão. Ou de orientação. Ou de frustração.
Pode até ser uma questão de tesão… ou não.
Pode ainda ser uma questão de alteração, de rectificação, de moralização.
Pode ser uma questão de reorganização, ou não.
Ainda pode ser uma questão de variação, ou de confrontação, ou de resolução. Pode ser ou não. Ou então pode ser uma questão de intimidação. Ou de retaliação, ou de apresentação, ou de conclusão, ou de confusão. Tudo pode ser ou não. O resto é indecisão ou comiseração.
Será, ou não?
Pode ser uma réstia de miscigenação, de confusão ou de socialismo de revelação, revigorado com afirmação e desorientação, consciente ou não. Pode ser que seja então o ar que diz não, o artista que sabe beijar uma mão, ou manejar um formão, ou refazer um serão, ou abanar um pavão.
30
Out06

Porta da memória

João Madureira
2004_0606Chavesdiversos0044.JPG
Não, não colecciono borboletas, nem selos, nem moedas, nem carros de corrida, ou caixas de fósforos, ou canecas de barro, ou navalhas, ou emblemas de carros, ou edições especiais do Expresso. Mas já coleccionei cromos de futebol, ainda nos tempos áureos do Eusébio, coleccionei também poemas ridículos e Tintins e Cutos e Jactos e Pilotes e colantes revolucionários. Muitos colantes revolucionários.
Agora colecciono fotografias, muitas delas de portas. Portas velhas, já gretadas pelo tempo.
Uma porta tem sempre um mistério. Uma porta é uma autoridade. É quase sempre um símbolo de fronteira entre o público e o privado.
Para mim também é uma memória dorida.
Uma vez, era eu ainda um menino muito devoto e bem-educado, o senhor abade convidou-me a mim e a mais um grupo de rapazes e raparigas que eram seus alunos, mais velhos do que eu, para irmos ver na sua televisão a peça de teatro Frei Luís de Sousa, de Almeida Garrett.
Eu, como era muito tímido, deixei-me ficar para trás. No momento em que ia a passar pela porta de entrada da casa, a governanta fechou-a intempestivamente na minha cara entalando, na sua fúria ou cegueira momentânea, um terço que eu tinha ganho pela erudição demonstrada na catequese.
A minha timidez era tanta que não consegui bater à porta para reclamar o que era património obtido com zelo e preparação.
Por isso lá ficou o objecto religioso prensado nas frinchas da porta.
Que me lembre foi a segunda vez que a tristeza se embrenhou em mim de uma maneira tão assustadora que ainda hoje, quando me lembro, uma mágoa totalitária toma conta de mim.
A primeira foi quando o meu pássaro morreu na gaiola.
Ainda hoje os olhos frios e abertos da pequena ave me inquietam como vento gélido.
29
Out06

… e pling e pang e peng e ping e pong!

João Madureira
2004_0905chavesaguasetembro0029.JPG

Pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung, pung…
28
Out06

Depois do ó... oh!oh!oh!

João Madureira
2004_0605Chavesdiversos0035.JPG
Então hã… indecisão hã… coisas hã… hã… ah, ah, ah…
ah, ah, ah… ah, ah, ah… ah, ah, ah… ah, ah, ah… indecisão, hã!
Então? Então ah ou não há?
Ah, ah, ah… ah, ah, ah… ah, ah, ah… ah, ah, ah…
Nesse caso o que está para lá?
Ah, ah, ah… ah, ah, ah… ah, ah, ah… ah, ah, ah…
Então Fá…
Ou não.
Então ah ou não há?
Ah, ah, ah… ah, ah, ah… ah, ah, ah… ah, ah, ah…
Então o que está para lá do… há?
Ah, ah, ah… ah, ah, ah… ah, ah, ah… ah, ah, ah…
Então Fá…
27
Out06

A amor curvado

João Madureira
2004_0730santoamaro29julho040015.JPG
Ai o amor, o amor mais amado, o clamor do amor, o amor à cor. A cor do amor.
O amor é música que desafina sem doer, é calor que queima sem ardor, é loucura que desatina sem chover, é chuva que cai e não se sente, é um desatino que moe sem corroer, é melodia que toca sem nos ver, é uma cicatriz moderna que não se contempla, é uma marca ditosa que não se entende, é um sorriso discreto que não se molha, é uma decisão indecisa que não se curva.
Ai o amor. O amor mais amado.
Ai o fado. O fado mandado. O amor falado.
O olhar trocado.
Ai o amor. O amor reservado.
O amor que é dado.
O amor soletrado. O amor fadado.
O amor com cor.
O amor sem dor.
O amor mais amado.
O amor calado.
26
Out06

A memória é fodida

João Madureira
j.mad.JPG
Escrevo-te cá de baixo, mas mesmo de baixo, debaixo de chuva, debaixo de vento e debaixo de uma depressão estupenda. Estupendamente estúpida, hieroglífica.
É que estou mesmo em baixo. Aqui todos me tratam por “pá”, “pᔠisto, “pᔠaquilo, “pᔠaqueloutro, “pᔠpara a frente, “pᔠpara trás.
E eu não estou nada habituado a este tratamento que, ao mesmo tempo que parece íntimo, resulta numa perfeita imbecilidade informativa e informal.
De informal tem pouco, tem mais de desleixo, de não te rales, de displicência e de frustrante indiferenciação social e humana.
Fora isto estou bem… mal.
Estou desnorteado. Ando desaustinado. Amorfo.
Tenho saudades de tudo o que por aí existe e continua a existir mesmo sem mim. Até já tenho saudades das pedras da calçada.
Tenho sentidas saudades de falar com os amigos.
Sim, eu sei que são poucos e maus, mas, mesmo assim, são os meus amigos.
Tenho muitas saudades de descer a rua Direita e depois subir a de Santo António. E tenho muitas saudades da minha doninha.
Por favor não te esqueças de lhe escovar os dentes e de lhe dar banho de emersão. Ela adora banhos de emersão.
Fora isso, tenho muitas saudades tuas.
Mas, reconheço, a opção deste retiro espiritual tem muito de esquizofrénico.
Ainda não consigo pensar no Largo das Freiras sem me arreliar.
Eu adorava aquele sítio.
Foi durante décadas o mais dilecto e acarinhado ponto de encontro de vários grupos de amigos que ali se juntavam para conviver, dizer umas larachas e discutir o sexo dos anjos. E por aí ficávamos até altas horas da madrugada, só pelo prazer do convívio, de nos ouvirmos uns aos outros, por sentir que estávamos vivos e que alguém nos considerava necessários na sua vida.
Alguns já morreram. E não há memória que doa mais do que lembramos vários amigos já desaparecidos sem os podermos associar ao seu espaço preferido.
Sem os lugares, a memória é irrisória, não se fixa, não se completa.
Com o desaparecimento das Freiras, esses meus amigos morreram duas vezes. E eles não mereciam isso. O respeito pela memória é bem mais importante do que algum progresso. Muito do denominado progresso actual é muito parecido com um retrocesso.
A memória, digo-te do fundo coração, é fodida.
25
Out06

Estrelinha imaginária

João Madureira
2004_0816quarteiracoimbra0080.JPG
Alguém saltou o muro da escola e ficou a olhar para o céu, estupefacto.
Uma estrelinha imaginária começou a crescer na testa da menina.
Um pouco mais atrás uma criatura alada cantarolou um cântico litúrgico.
Soprava uma ligeira brisa quando a águia se lançou voraz sobre o coelho companheiro da Alice no País das Maravilhas.
O Gato das Botas começou a tocar a flauta do Flautista de Hamelin e levou todos os ratos para a sua herdade. Agora engorda-os e vende-os já mortos para uma cadeia de supermercados devidamente embalados e congelados.
Branca de Neve divorciou-se do Príncipe Desencantado e voltou para os seus anões.
Afinal, tirando a altura, os anões são homens como os outros. Têm tudo o que é necessário e no devido sítio. Desculpem o desabafo.
A menina das trancinhas de prata transformou-se em catwoman e foi passear pelos céus de Lisboa.
O Malhadinhas voltou à sua terra natal, comprou um carro desportivo e joga videogames.
O Cantiflas aceitou o papel de super-homem e fez uma revolução em Cuba.
Fidel Castro chorou de riso.
Soprava uma ligeira brisa no Malecón quando um anjo bom levou a alma do ditador cubano para o céu.
Logo de seguida, Charlie Brown anunciou ao povo cubano que era livre.
Decididamente, o Snoopy anda a tomar alguma substância alucinogénea.
24
Out06

Tudo me lembra

João Madureira
2004_0606Chavesdiversos0004.JPG
Tenho saudades infinitas do som da chuva quando batia no zinco da parede de minha casa em noites frias e turbulentas de Inverno.
Tenho infinitas saudades desse período mágico em que aprendia a sonhar com o lento cinzelar do tempo na cara da minha avó.
Tenho ainda infinitas saudades da luz clara do amanhecer em alvoradas inundadas de neve e frio.
Tenho eternas saudades de pisar a neve dos caminhos pela primeira vez.
Tudo me lembra: os sons do vento, o gemido dos gatos, o ladrar monótono dos cães, o cantar das almas do purgatório, a conversa dos gigantes do Larouco, a agitação frenética das folhas mortas dos carvalhos, o tilintar das moedas no bolso do meu pai, o fumo a sair das chaminés tristes, o chorar das crianças desalentadas, o piar dos mochos, o brilho das geadas, a lareira a arder, a agitação do vento gelado fustigando as ovelhas, as palavras repetidas das missas de domingo, as brincadeiras em torno de um banco ou em cima de uma árvore, as nuvens a fugir no céu, o brilho das estrelas cadentes, o cheiro do feno, o cantar dos grilos nas tocas, os voos nocturnos das bruxas, o grito aflitivo dos dementes, o sorriso discreto das vacas, o rastejar das cobras e dos lagartos, a água a correr nas pedras do castelo, o colher do musgo para o presépio, o corte picante dos ramos de azevinho, a água a ferver nos potes, o torrar do pão ao lume, a matança do porco, a leitura de histórias nas manhãs gloriosas de domingo, o sorriso apaziguador de minha mãe, o meu pai, o meu pai, o meu pai, e as minhas irmãs, e os meus amigos…
23
Out06

Por ventura

João Madureira
2004_0606Chavesdiversos0019.JPG
Fui em busca de aventuras, mas elas não apareceram.
Fartei-me de andar para nada. Melhor seria ter ficado em casa sem fazer patavina.
Agora não vale a pena chorar sobre leite derramado.
22
Out06

... e pung

João Madureira
jmadpung.JPG
Peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng, peng…

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