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TerçOLHO

Este é um espaço dedicado às imagens e às tensões textuais. O resto é pura neurastenia.

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12
Jun17

346 - Pérolas e diamantes: O vazamento das evidências

João Madureira

 

 

 

Laurent Binet escreveu um livro suficientemente divertido sobre Roland Barthes (escritor, sociólogo, crítico literário, semiólogo e filósofo francês que fez parte da escola estruturalista, influenciado pelo linguista Ferdinand de Saussure), partindo da suposição de que afinal não morreu por causa de um acidente estúpido mas antes vítima de um homicídio premeditado.

 

Ou seja, o maior crítico literário do século XX terá sido assassinado por possuir qualquer coisa de muito poderosa.  

 

A Sétima Função da Linguagem parte de uma frase inicial: “A vida não é um romance.”

 

De facto, a morte de Barthes deu-se em circunstâncias um pouco tristes. Foi atropelado quando saía de um almoço com François Mitterrand, então candidato à presidência da França.

 

Ser mestre na utilização da linguagem, todos o sabemos, é muito proveitoso. A semiótica é útil para entender o mundo e a retórica é útil para lidar com ele.

 

Para atingir o poder, a linguagem é uma arma poderosa. Binet, para construir o seu romance, parte do princípio de que a linguagem é a arma mais poderosa do mundo e há mesmo quem mate para dominar o seu segredo.

 

Roland Barthes era um descodificar do modo humano de comunicar. Possuía até uma qualidade intelectual que os medíocres apreciam imenso: conseguia falar de bifes com batatas fritas, de carros, de filmes do James Bond, fazendo uma abordagem muito lúdica da Linguística.

 

Afinal, segundo os entendidos, a Semiologia é isso mesmo: uma disciplina que aplica os métodos da crítica literária a objetos não-literários. É o estudo da vida dos signos no seio da vida social.

 

Lá pelo meio do livro aparecem estudantes de alpargatas e peúgas distribuindo panfletos onde se pode ler: À Espera de Godard, peça em um ato, a que eu gostaria de ter assistido.

 

E também existem as personagens que buscam a verdade. Os medíocres estão espalhados por todo o lado. E a verdade… A verdade… “Onde é que ela começa, onde é que ela acaba… Estamos sempre no meio de alguma coisa.”

 

A verdade só existe se for exibida. É um símbolo. E um símbolo escondido não serve para nada. Não existe.

 

Por exemplo, Jean Daniel escreveu um editorial sobre Mitterrand no Nouvel Obsevateur, em 1966, onde apresentou esta certeza: “Este homem não dá só a impressão de não acreditar em nada: perante ele, sentimo-nos culpados de acreditar em alguma coisa. Ele insinua, como quem não quer a coisa, que nada é puro, que tudo é sórdido e que nenhuma ilusão é permitida.”

 

Numa conversa entre espiões de gabarito, a dado momento uma personagem pensa que nada existe de mais desconfortável para alguém disposto a mentir do que ignorar o nível de informação do seu interlocutor.

 

Quando se mente, há que mentir, como pensa o camarada Kristoff, apenas num ponto. E num só. Em tudo o resto tem de se ser perfeitamente honesto.

 

Barthes detesta aborrecer-se, mas oferecem-lhe tantas oportunidades que não lhe resta outra solução se não aceitá-las. Sem saber bem porquê, convenhamos.

 

Os políticos aprenderam já há muito tempo que para se ter sucesso é necessário possuir um elevado grau da arte de enunciar as evidências.

 

Barthes, sempre conciliador, alegava: “Uma evidência não se demonstra, vaza-se.”

 

A arte de governar afinal não passa de nos convencer de que o governo não é responsável por nada.

 

Por isso lhe dói o balanço das contas.

 

“O momento difícil de uma vida, a dele, a vossa, a minha, de toda a vida que se pretende ambiciosa, é aquele em que se inscreve o sinal na parede a dizer-nos que começamos a imitar-nos a nós mesmos.”

 

A linguagem, quer queiramos ou não, serve para produzir uma mensagem que só adquire sentido no momento em que existe um destinatário. Apenas os loucos tagarelam no deserto.

 

Ainda não apurei se o Laurent Binet é ou não um bom romancista, o que sim sei é que a sua fasquia é muito alta, pois considera que “se houver Deus, ele será um mau romancista”.

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