A meditação do castanheiro excêntrico
Cai-me o céu nos braços. Nestes braços que se abrem à luz magnífica do sol, ao voo dos pássaros irresolutos, ao azul transparente do delírio.
Quanto mais vivo mais me apetece viver. Por isso multiplico os ramos. Por isso engrosso as raízes. Por isso rebento
Só não gosto dos homens, da sua cobiça, do seu sentido de missão, da sua religiosidade sacrificial. Da sua domesticidade imbecil.
Os homens comem-me os frutos mas primeiro tudo faço para que se piquem nos ouriços.
Gosto mais de alimentar os porcos, pelo menos esses não falam
Os porcos têm sempre fome, nisso assemelham-se aos humanos.
Os humanos estão sempre a comer e a falar. A dizer mal uns dos outros, sempre a invejarem-se, sempre a competirem por coisas sem valor nenhum, como o dinheiro, ou o ouro. É curioso que eles adoram o ouro e buscam-no por toda a parte mas não conseguem comê-lo. Só o transportam ao peito ou ostentam-no nos dedos. Alguns fazem mesmo dentes com ele, mas não o comem, só o exibem. Outros escondem-no em cofres e só olham para ele à noite, com medo que lho roubem.
Mas o que eu mais gosto é de ver nascer o sol todos os dias. Todos os dias. Todos os dias.
Gosto de ver nascer o sol todos os dias. De ver nascer o sol. O sol.
Todos os dias o sol.Todos os dias.
Todos os dias do mundo, o sol a cair-me nos braços