Detesto moralistas
Detesto moralistas.
Sei que nos tornamos moralistas logo após nos invadir a infelicidade.
Por isso não me quero enredar em tal teia, por muito que a tal seja levado.
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Detesto moralistas.
Sei que nos tornamos moralistas logo após nos invadir a infelicidade.
Por isso não me quero enredar em tal teia, por muito que a tal seja levado.
Há algo de patético e absurdo na verdade. Apesar de todos a conhecerem, poucos lhes são fiéis. E mesmo esses, por vezes, renegam-na conjunturalmente. E fazem-no mesmo avisados pela razão e pelo galo bíblico.
A senhora Swann “tinha o hábito de dizer às suas amigas que mais facilmente passaria sem pão do que sem arte e sem limpeza e que lhe daria mais pena ver arder a Gioconda que «montes» de pessoas suas conhecidas”.
Marcel Proust – “À Sombra das Raparigas em Flor”
Afinal, contra todos as expectativas humanas, sociais e políticas, o dinheiro ganhou a guerra. O luxo impôs-se e o poder, como finalidade, triunfou. Bem vinda sejas, felicidade. Bem vinda sejas. Felicidade, bem vinda sejas. Ó felicidade!
É cíclico, mas amargura.
De dois em dois anos, a selecção faz com que os chineses confeccionem bandeiras portuguesas com pagodes em vez de castelos e incentiva as vendas no Modelo/Continente Belmiro Sonae e Azevedo de cachecóis e camisolas tingidas de verde, vermelho e amarelo.
Junto dos campos de futebol, naquelas arenas de sádicos malcriados, os carros e as pessoas misturam-se entre apitos e carvalhadas.
Os passeios e as estradas transformam-se em mancha humana. O folguedo é de romaria.
De facto há festa. E fé. E santos. E pecadores. E pecadoras, também. E os fiéis lá depositam a dízima em troca de algum espectáculo de atordoamento e ferocidade.
Dizem-nos que vivemos na fase mais avançada da nossa civilização, que a nossa sociedade é cultural.
Eu desconfio. Afinal, basta um jogo de futebol para o homem se transformar num bárbaro.
Pling... plong... plang...
Dedicado a todos os valorosos idealistas marxista-leninista, que, apesar de tudo, ainda acreditam na utopia dos campos de concentração.
Kolyma
Os que estão doentes e não prestam
Fracos de mais para a mina
Descem em vão
Para o campo mais abaixo
Abater as árvores de Kolyma.
É muito simples quando
Se escreve no papel. Mas nunca poderei esquecer
A cadeia de trenós sobre a neve
E as pessoas arreadas.
Esticando os seus peitos fundos, puxam os carros
E param para descansar
Ou vacilam nas ladeiras escarpadas…
O peso pesado rola e desliza
E a qualquer momento
Vai atropelá-las…
Quem nunca viu um cavalo a tropeçar?
Mas nós, nós vimos pessoas com arreios…
Elena Vladimirova
(Gulag – Uma História; Anne Applebaum)
É difícil de admitir, mas a visão límpida de certas intimidades não nos inferioriza em nada, antes ajuda a ternura.
A ternura, mesmo parecendo quer não, fortalece-se com a intimidade, tornando-se, por assim dizer, em encantamento.
A verdade dói. Dói até por cima da razão. As coisas nunca voltam a ser aquilo que já foram. E, o que ainda é mais doloroso, é quase certo que não o eram na altura em que o eram mesmo. Mas não importa. Agora somos. É bom que se acredite em algo límpido. As crenças perseguem os recursos.
Eu sei que não sou propriamente um modelo de ser humano. Outra coisa não seria de esperar de um transmontano agreste, ateu e apátrida. No entanto não consigo, por mais que queira e me esforce, respeitar um mundo em que nada daquilo em que acredito é valorizado. Continuo a envelhecer dentro de uma cabeça que desdenho, dentro de uma cultura que desprezo e dentro de um país onde me não revejo.
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