Não me tentes
Não me tentes com a teoria de arrasar tudo. Sei que alguém pegou na máquina fotográfica e pôs a tua cabeça a levitar. Com todo o caudal sumptuoso do pavor alguém exige voltar ao princípio. O que é isto, meu deus!
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Não me tentes com a teoria de arrasar tudo. Sei que alguém pegou na máquina fotográfica e pôs a tua cabeça a levitar. Com todo o caudal sumptuoso do pavor alguém exige voltar ao princípio. O que é isto, meu deus!
Vêm devagar as cores das palavras. Correm loucas as vozes arrefecidas da neve forte. É fria a rede de jardins que ilustram a minha infância. Ou o que resta dela. Pelas tuas mãos se mede a nostalgia dos exemplos. Tu estás dentro de mim por isso te sinto como um meteoro.
A loucura é uma despedida dolorosa.
As barcas do inferno gritam sobre as águas enquanto as pontes iluminadas estruturam a passagem das almas obcecadas.
Toda a largura do céu exacerba a boca da noite.
Têm tantos dedos as mãos fortes!
Andam no ar prodígios de destruição.
Arde-me a acumulação dos dedos na voragem das mulheres sentadas.
Dizem que Deus ajuda as mulheres amadas.
Dizem também que Deus ajuda a eternidade amarga da beleza.
O amor acumula-se por debaixo dos nomes.
Animais irrompem pelas barreiras do frio e respiram por delírios carregados de devassidão. Têm cabeças cruéis fervilhando de sombras, perfurando pedras de som por entre a transparência da pele. As nervuras das agulhas pungem a paixão dos paredões de luz. O vazio das vírgulas multiplica-se na desarrumação do silêncio. As asas vingativas dos insectos arquejam na altura das montanhas. As tensões vingativas dos corpos incendeiam o delírio das imagens poliédricas. Também o vácuo vertical irradia cerimónias ásperas de enlevo. São as vozes do vazio quem multiplica as pétalas do silêncio. O silêncio celebra as aparições claras. O silêncio ferve. O silêncio coloniza o vazio. O silêncio invade os parques varridos pelos animais obscuros. O silêncio dorme a teu lado como uma maldição. O silêncio…
Caminhante, não há caminho….
Pliiiiiiiing…
“Isso sacudia-as, soprava-lhes nas cabeças, viviam numa época nervosa, e qualquer coisa não batia certo, cada um se achava inteligente, mas todos juntos sentiam-se estéreis. E se ainda por cima tivessem talento – e a sua imprecisão de modo nenhum excluía isso – o que se passava nas suas cabeças era como ver o tempo e as nuvens, os comboios, os fios telegráficos, as árvores e os animais e todo o cenário animado do nosso querido mundo através de uma vidraça estreita e suja; e ninguém iria notar facilmente isso na sua própria janela, mas apenas na do vizinho.”
O homem sem qualidades – Robert Musil
“Mas depois veio um senhor chamado Bismark que pelo menos uma coisa boa fez: mostrou que a política não se faz nem com discursos nem com inteligência! Apesar dos seus lados sombrios, conseguiu que, desde o seu tempo e até onde a língua alemã alcança, todos ficassem a saber que na politica não há nada a esperar de inteligência e discursos, mas tão-somente da reflexão silenciosa e da acção.
O homem sem qualidades – Robert Musil
“Mas também noutras esferas se passava muita coisa que era difícil de descrever em palavras, de tal modo que a alma pressentia, como um rufar de tambores, algo de invisível que ainda não dobrou a esquina. Os funcionários dos reais e imperiais telégrafos faziam pela primeira vez greve, de forma altamente inquietante, a que se deu o nome de resistência passiva e que consistia, nada mais nada menos, em se observar com o maior rigor e estrita pontualidade todos os regulamentos de serviço; e depressa se constatou que a estrita observância de todas as leis era mais capaz de levar à paralisação de todo o trabalho do que o faria a mais desbragada anarquia.”
O homem sem qualidades – Robert Musil
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