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TerçOLHO

Este é um espaço dedicado às imagens e às tensões textuais. O resto é pura neurastenia.

TerçOLHO

Este é um espaço dedicado às imagens e às tensões textuais. O resto é pura neurastenia.

11
Jul11

Um (S. K:), Dois (VPV) e Post-Scriptum

João Madureira

 

Um - Confesso-vos, gosto muito dos filmes de Stanley Kubrick. Na sua análise irónica e crua, faz sempre uma fascinante, e muitas vezes perturbadora, aproximação à realidade. Na sua obra a ordem e o caos convivem lado a lado sem sequer se atrapalharem. Docemente. Para Kubrick, os planos que cada um faz para a sua vida nunca podem ser levados muito a sério devido à imprevisibilidade da natureza humana.

 

O realizador tinha a perfeita consciência de que os caminhos que a humanidade teima em seguir vão dar a um abismo. Além disso defendia que o que aprendemos com a História, na verdade, não nos serve de muito, porque a verdade é que nunca aprendemos com ela. A História tende a repetir-se. Ciclicamente. Anedoticamente.

 

Os impulsos do homem e a sua inata violência serviram de alimento para o seu psicanalítico filme “Laranja Mecânica”. A excitação cinematográfica da guerra deu lugar ao “Nascido Para Matar”. Já “Barry Lyndon” fala-nos da fragilidade humana e da inconsequência conduzida por um homem que se deixa perder por uma paixão.

 

Kubrick defendia que os seres humanos são governados pelas emoções e não pela razão. As emoções falam sempre mais forte do que a inteligência e o conhecimento. Em “Dr. Estranho Amor” conta-nos uma evidência: apesar de as armas serem cada vez mais poderosas, os homens continuam fracos, pois os seus corações não mudaram.

 

Muitos disseram que o seu cinema passava um pouco ao lado da dimensão emocional porque se deixava encaixar dentro de um formalismo cerebral muito acentuado. Mas quem não se emocionou com o seu humor inteligente em “2001 Odisseia no Espaço” e com a célebre morte de uma máquina, o comovente HAL 9000.

 

Outra das coisas que o seduzia, e que de certa maneira influenciaram a minha maneira de ser e de pensar, era o fascínio pelas estruturas totalitárias e a violência do Estado. Quando jovem vi “Laranja Mecânica” no antigo Cine-Teatro de Chaves. E aquilo nunca mais me saiu da cabeça.

 

Kubrick vivia permanentemente em actualização informativa, por isso se interessava com a velocidade a que ela se transmitia. Para realizar as suas obras reunia sempre o máximo de informação de que era capaz. Foi nos seus filmes que descobri que a sociedade da informação, baseada na tecnologia, tornou extremamente fácil as pessoas magoarem-se.

 

Dois - E agora algo completamente diferente. Magoado anda Vasco Pulido Valente. E com razão. Afinal tudo o que escreveu tem, aos olhos do mundo, a dimensão de uma putativa História de Alicante. A realidade é mesmo essa. Apesar de a sua inteligência ser brilhante, lúcida, clara e cáustica, o país pregou-lhe uma partida. É, como bem dizia Manuela Ferreira Leite, piqueno. Não tem dimensão. Nem os nossos problemas históricos interessam ao mundo.

 

Na perspectiva de Vasco Pulido Valente, chegou o cobrador vestido de FMI que nos vai levar as pratas. Além de nunca ter deixado de fumar nem de beber, e ter chegado aos setenta, VPV está assarapantado com um problema que diz ser grave, o de saber se existe algum líder nacional que “politicamente seja capaz de persuadir os portugueses a passarem dez ou quinze anos a viver daquilo que produzem”. 

 

E como não há homens intocáveis, passo a citar: “Toda a gente geriu mal. Mesmo o doutor Cavaco, que até ser reeleito não abriu a boca. E ele sabia da crise.” Pois ele lê o “The Economist” e os relatórios do Banco de Portugal. Lá diz o povo: Tão ladrão é o que vai à horta como o que fica à porta.

 

De José Sócrates disse o que nem Maomé se atreveu a dizer do toucinho e, ainda, que foi o controleiro do PS. Sobre Pedro Passos Coelho afirma que “nem o seu Governo nem o próprio primeiro-ministro interessam muito. Interessa, é saber se as pessoas estão com medo para obedecer”. Parece que sem medo e sem obediência não há futuro. VPV sabe do que fala.

 

Sobre o putativo neoliberalismo de Pedro Passos Coelho e Paulo Portas, defende que “isto não é liberalismo. Isto é vender as pratas”. E finaliza com nova praga bíblica: “Todos esses rapazes, como o Barroso e o Guterres, que a gente já se esqueceu do que fizeram, hão-de aparecer aí outra vez”.

 

E profetiza: “A Europa morreu”.

 

 

PS – Enquanto a notícia não se confirma, aconselhamos, como sugestão da “Ás de Copos”, os estimados leitores a prepararem mais um apetitoso cocktail, pois vai muito bem com o Verão e com a crise. E se tiverem uma piscina ao lado ainda melhor.

 

Vodka Collins Pimento – 1 fatia de pimento; 2 cl de xarope de açúcar branco ou amarelo; 3 cl de sumo de limão natural, que podem ser substituídos por 3 cl de sumo de laranja, a dar-se o caso de ser militante ou simpatizante do PSD; 6 cl de vodka, que podem ser ampliados até aos 10 cl se for militante ou simpatizante do PCP. Técnica: Agitar tudo no shaker, coar bem e juntar água com gás até ao cimo, de preferência “Águas das Pedras”, porque é a melhor. Decoração: Rodela de pimento. Tempo de preparação: 5 minutos. 

08
Jul11

O Homem Sem Memória

João Madureira

 

71 – Emboscada ao capitão escoteiro mirim do monóculo de plástico (continuação I).

Cena 5 (take 3). “Então quem se oferece para vir a ter o privilégio de ser o meu novo burro?”, perguntou, enfunado de brio, o capitão escoteiro de chapéu colonial, monóculo e pinguelim de varinha de salgueiro. Ao que o Francisco respondeu: “O teu burro já vai lá longe e não me parece que volte.” E o capitão mirim: “Então, meu caro Francisco, não te ofereces como voluntário para o cargo que ainda permanece vago? Tu que sempre me foste fiel. Se bem me lembro, estavas permanentemente disponível para substituir o Joaquim como guarda-redes e agora…” E o Francisco: “Uma coisa é substituir, ou trocar de lugar com o guarda-redes, outra, bem distinta, é substituir um burro.” O capitão mirim: “São uma e a mesma coisa. É tudo em prol da sagrada união do nosso grupo. Tudo em defesa da exaltação do espírito de corpo. Tu tens o dom de substituir seja quem for. És pau para toda a colher.” O Francisco paciente: “Reconheço que tenho algum jeito para defender uma baliza, mas não tenho feitio nenhum para ser burro.” De novo o capitão mirim: “Ai isso é que tens.” O Francisco: “Se teimares no mesmo caminho vais ter nova deserção.” O capitão mirim cauteloso: “Pronto, não te amofines…” O Francisco aliviado: “Assim está bem. Mostras que és um chefe sensato. E é disso que nós precisamos.” Novamente o chefe mirim: “Quem se oferece para ser o meu burro, o lugar continua vago e à espera de ser preenchido?” Ao que o Francisco respondeu: “Acho que te deves habituar à ideia de seres um comandante sem montada. Essa teimosia pode fazer com que te vejas na triste situação de vires a ser um capitão sem tropas.” “Nomeio-te meu conselheiro vitalício”, propôs rápido o chefe mirim, “e não admito uma recusa”. Iriam ser golpes semelhantes que o elevariam, mais tarde, à categoria de secretário de Estado.

Cena 6 (take 3). Ainda empoleirados nas suas árvores, o Graça e o José continuam a observar o avanço das tropas inimigas. Diz o Graça para o José: “Continuam a falar. Nunca mais se decidem a avançar. Eu quando espero, desespero. Ferve-me o sangue e turvasse-me a vista.” Foi esta impaciência o que o levou a emigrar para Espanha e a transformar-se num mecânico de automóveis. Responde o José: “Deixa-os lá. Discutem as chefias, tentam defender as suas ideais, lutam pelos seus direitos, fazem valer os seus pontos de vista. Organizam-se democraticamente. Partilham as decisões. Reivindicam o direito de cidadania.” Foram palavras como estas que pregaram com os costados do José na cadeia e fizeram dele um dos mais notáveis presos políticos do Portugal do socialismo real. O Graça: “Ó José, por vezes não te compreendo. Não sei se brincas e entretanto falas sério. Ou se falas a brincar e eu te levo a sério. Ou se levas tudo tão a sério que parece que estás sempre a brincar, mesmo quando não brincas e não falas a sério.”

Cena 7 (take 10). E de novo as tropas do capitão escoteiro de chapéu colonial, monóculo e pinguelim de varinha de salgueiro se puseram a caminho. Os cães pisteiros à frente, o exército em fila indiana e o chefe, agora apeado, marchando sobre o seu lado direito. “Tenho sede”, disse um dos cães. “Eu também”, disse o outro cachorro. “Os cães não falam, mesmo quando têm sede”, lembrou o capitão mirim. “Nós também temos sede”, gritaram em uníssono os soldados escoteiros. “Assim nunca mais chegámos à guerra. Nunca mais enfrentamos o inimigo. Nunca mais conquistamos o seu território. Nunca mais nos enchemos de honra e glória”, avisou o chefe. E os soldados: “Mas nós temos muita sede e um exército cheio de sede não combate bem”, lembraram os escoteiros. “Tendes sede porque só falais. Os soldados não falam, não reivindicam, combatem…” “Mesmo quando têm sede?” “Sim, mesmo quando têm sede.” “Mesmo quando têm fome?” “Sim, mesmo quanto têm fome.” “Mesmo quando têm calor?” “Sim, mesmo quando têm calor.” “Mesmo quando têm dúvidas?” “Sim, mesmo quando têm dúvidas.” “Mesmo quando têm medo?” “Sim, mesmo quando têm medo. Mas os meus bravos escoteiros não têm medo. Ou têm?” “Nós temos é sede.” “Os meus bravos escoteiros não são cobardes, pois não?” “Nós temos é sede.” “Os meus bravos escoteiros não têm medo da luta, pois não? Os bravos guerreiros do meu pelotão não são cobardes, ora não?” “Eu não sei o que é ser cobarde?”, confessou o Felisberto. “Ser cobarde é ter medo de combater…” “Só?” “Sim. Ser cobarde é ter medo de combater.” “Só?” “Sim…” “Não. Para ser cobarde é necessário também fugir. Porque ter medo todos temos. Pelo menos isso é o que diz o meu pai. E ele ficou sem uma mão a combater os turras”, disse o Mário Maneta, assim apelidado, não por ser maneta mas por ser filho do João Maneta. “Pelo caminho que isto leva, nem a puta da discussão acaba, nem o combate começa. Em frente marche”, ordenou o capitão escoteiro de chapéu colonial, monóculo e pinguelim de varinha de salgueiro. “Eu desisto se não beber um golo de água”, disse o Carlos Ranheta disfarçado de primeiro cão pisteiro. “Eu também desisto da guerra se não beber água”, disse o Manuel Merrinhau deitando-se num tufo de ervas meias secas. “Nós também desertamos se não bebermos água” disseram a uma voz todos os sedentos bravos do pelotão. “Mas aqui não há água”, avisou o chefe mirim já visivelmente desorientado. “Existe uma nascente além ao pé dos carvalhos”, esclareceu o Pinto Manco, assim conhecido por ter um pé boto. “Mas para irmos lá vamo-nos desviar muito do nosso trajecto. O território do nosso inimigo fica quase na direcção oposta”, lembrou o capitão mirim. “Isso desvia-nos muito do nosso alvo. Temos de seguir em frente”, concluiu. De seguida ordenou: “Em frente marche!” “Em frente marche o caralho”, avisou o Carlos Ranheta camuflado de primeiro cão pisteiro. E todos se deitaram no chão ao lado do Manuel Merrinhau. “Eu proponho que se vote se devemos ir para a batalha mortinhos de sede, se devemos ir além à nascente dos carvalhos beber água ou se devemos ir para casa porque tenho muita fome”, propôs o primeiro cão pisteiro Carlos Ranheta, também conhecido pelo Esfomeado. “Nem é necessário recorrer a nenhuma votação, eu mesmo ordeno que recuemos até nossas casas para almoçar. Um soldado cheio de sede e de fome não consegue lutar”, ordenou o capitão escoteiro de chapéu colonial, monóculo e pinguelim de varinha de salgueiro. Mais uma vez lembramos que foram tiradas como esta que o elevaram ao cargo de secretário de estado do Estado.

Cena 8 (take 3). Ainda mais empoleirados nas duas árvores, o Graça e o José observam intrigados o recuo das tropas inimigas. Diz o Graça para o José: “Não entendo nada desta guerra. É muito táctica para o meu feitio. Primeiro avançam, depois param, logo discutem, depois deitam-se no chão e, finalmente, recuam. Assim não sei brincar.” O José, apontando para um vulto que se aproximava deles empunhando umas cuecas brancas na ponta de um pau, exclama: “Um mensageiro.” Após uma pausa, disse o Graça para o vulto: “Diz lá o que tens a dizer e rápido, antes que te esganemos.” O mensageiro aflito, pois sabia dos maus fígados do filho do sargento, balbucia: “Na guerra não se esganam os mensageiros.” “Mas isto não é uma guerra a sério. Quando se brinca tudo é permitido, até estrangular mensageiros que empunham cuecas brancas todas sujas. Ciscaste nas cuecas, cagão,” ironizou o Graça gargalhando. “As cuecas não são minhas, são do Manuel Merrinhau. O nosso chefe manda dizer que vamos para casa almoçar e que logo vimos. E que a vitória será nossa.” “Vai-te foder cagão, e diz lá ao teu chefe que cá o esperamos.”

06
Jul11

O Poema Infinito (55): a verdadeira poesia e o verdadeiro poeta

João Madureira

 

A verdadeira poesia começa no mito da verdadeira poesia que se confunde com um filme mudo visto nos dias de hoje como se fosse um filme sonoro a quem se lhe tirou o som. Na verdadeira poesia o que conta é o corpo que pergunta à vida se o amor vale mesmo a pena. Esta é a ocasião para o verdadeiro poeta começar a desconfiar se a sua poesia é indiferentemente verdadeira. Aos poucos, a verdadeira poesia e o verdadeiro poeta começam a cair no realismo e a revelar uma tendência absurda para apalparem os seios das mulheres ricas e falarem na beleza auxiliar das camisas dos pobres. E em auxiliar os pobres. E em emocionarem-se com os pobres. E os pobres, é claro, começam a desconfiar tanto da verdadeira poesia como do verdadeiro poeta e dos restantes poetas que os acompanham. O rico esconde o trabalho do pobre e o pobre emociona-se com a riqueza do rico e, entretanto, o poeta verdadeiro continua a apalpar os seios das mulheres ricas e a escrever poesia verdadeira onde enaltece as calças coçadas do operário, as mãos calejadas dos agricultores, a lírica disformia das mulheres do povo, dos seus cabelos confundidos, dos seus bigodes controlados. E em caligrafia fina e estudada, o verdadeiro poeta desenha o D de Democracia, para gáudio da verdadeira poesia que outra coisa não esperava do seu criador e amante. O verdadeiro poeta segue em frente e ultrapassa a fronteira natural do bom gosto. E o bom gosto agradece e retribui e ultrapassa, também ele, a fronteira natural do verdadeiro poeta, que é, como todos sabemos, a verdadeira poesia. E a verdadeira poesia agradece mais este sinal de bom gosto e qualidade. O verdadeiro poeta, entretanto, monta no corpo ardente das fêmeas ricas desculpando-se mais uma vez de novo golpe baixo da dialéctica da escrita. Todos os leitores apreciadores da verdadeira poesia o desculpam, pois todos nós sabemos que o verdadeiro poeta não é um anjo e muito menos um homem sem defeitos. Um homem sem defeitos pode ser tudo menos um poeta verdadeiro que escreve verdadeira poesia. Este é um dos mais louváveis axiomas do verdadeiro poeta: a virtude dos seus defeitos. E lá vêm as ninfas e lá saltam as vaginas vulcânicas e lá se abrem as bocas famintas de amor e lá brilham os olhos dos amantes e lá dançam os verdadeiros poetas de roda das suas liras de prata e lá irradia a essência dos versos como coisinhas fofas no meio de uma boda carismática e lá namoram as substâncias proibidas sem as quais a verdadeira poesia e o verdadeiro poeta dificilmente existiriam. E o verdadeiro poeta impacienta-se e bate forte e feio na verdadeira poesia. E a verdadeira poesia chora e geme e suplica tréguas. Então o verdadeiro poeta enche o peito de ar e escreve o poema definitivo que começa assim: Nesta leal confusão onde irá Zenão. Será que você sabe ou não?

04
Jul11

O fim de uma ilusão

João Madureira

 

Devolvido Sócrates ao anonimato mediático, eis que os triunfadores da “causa pública” se atarefam na imensa, e inglória, tarefa de crucificar quem se lhe segue. E é bem feito, sim senhor. A política é isso mesmo: retirar uns do poleiro e pôr lá outros para seguirem o mesmo caminho. E, para isso, são fundamentais as televisões e os jornais. É aí onde se alojam os milhares de génios que diagnosticam as origens da crise e é lá, nesse oráculo da revelação, que propõem a cura. Ali em directo, como deuses da verdade, no seu Olimpo de certezas. E falam e falam e continuam a falar porque apenas eles nos podem salvar. E se não for possível a salvação ser servida ainda durante a noite das tertúlias, ou dos directos televisivos, ela virá logo pela manhã, fresquinha como o “biju” onde, para nosso deleite, a manteiga ainda derrete.

 

(E a promessa de Pedro Passos Coelho, no dia das mentiras, de que não… )

 

Abençoados sejam os engenheiros, os economistas, os políticos, os gestores, os médicos, os funcionários superiores, os filósofos, os professores universitários, os diplomatas, os advogados, os juízes e as mil e uma castas de palradores empertigados na sua importância e nas suas certezas passageiras, que raiam a esquizofrenia.

 

(E a promessa de Pedro Passos Coelho, no dia das mentiras, de que não ia mexer no 13º mês…)

 

Quem, como eu, os ouve, fica irremediavelmente com a impressão de que a nossa jovem democracia esteve entregue aos incompetentes, aos mentirosos, aos ladrões. Daí a actual situação de emergência nacional. E a pergunta impõe-se: será unicamente por culpa de Sócrates, Durão Barroso, Guterres, Cavaco Silva, Mário Soares, Ramalho Eanes, Sá Carneiro e Freitas do Amaral e Vasco Gonçalves? E o povo pá? Pois, os camaradas da luta têm razão, o povo quer, é um carro novo mas, com o PSD no Governo, para já, saiu-lhes um subsídio de Natal com o bónus de menos 50%. Portugal à direita é mesmo assim. É o Continente a céu aberto. Mas mentirosos eram os outros: os do Sócrates. 

 

(E a promessa de Pedro Passos Coelho, no dia das mentiras, de que não ia mexer no 13º mês a provocar-me azia…)

 

Na minha humilde perspectiva, a realidade remete-nos necessariamente para uma outra visão dos factos. Todos nos lembramos, e os que não se podem lembrar devem consultar os livros de História Contemporânea, do Portugal salazarista pobre, antiquado, arcaico, medieval, e, em muitas localidades, mesmo primitivo. Todos nos lembramos também da primavera marcelista que deu alguma esperança de desenvolvimento a muita gente e que acabou torpedeada pelo pronunciamento militar do 25 de Abril, bem ao jeito das ditas revoluções que tiveram lugar nos séculos XIX e XX.

 

(E a promessa de Pedro Passos Coelho, no dia das mentiras, de que não ia mexer no 13º mês a provocar-me azia e a música do Bandemónio…)

 

Após Abril de 1974, por mérito da esquerda, e pelo desnorte da direita, instalou-se o mito nocivo de que Portugal poderia, em meia dúzia de anos, tornar-se, por obra e graça do Espírito Santo, um país com os níveis de desenvolvimento da Europa Ocidental. E, vai daí, começou-se a reivindicar tudo e mais alguma coisa. Todos à uma fomos para a rua exigir o Estado Social, salários adequados, habitação, educação e saúde gratuitas, universidades de excelência, empregos para toda a vida, subsídio de férias e décimo terceiro mês, férias no estrangeiro, carro novo, hospitais e centros de saúde com qualidade, estádios de futebol, auto-estradas espalhadas pelo país e quase todas à borla, subsídios de desemprego generosos e alargados no tempo, rendimento mínimo garantido e muito mais mordomias que seria cansativo aqui referir ao pormenor.

 

(E a promessa de Pedro Passos Coelho, no dia das mentiras, de que não ia mexer no 13º mês a provocar-me azia e a música do Bandemónio Pedro Abrunhosa…)

 

Entretanto a produção nacional não aumentou, extinguiu-se o ensino técnico, o nível cultural não se elevou, o ensino perdeu qualidade. Só que, com a entrada dos fundos comunitários nos cofres do Estado, e nos bolsos de agricultores, pescadores, formadores, banqueiros, etc., o bom senso desapareceu e todos entrámos em euforia. Com uma manifestação conseguia-se um aumento, com uma greve outro aumento, e com a tomada de posse dos sucessivos governos foi-se espargindo, como estrume, dinheiro sobre os problemas.

 

(E a promessa de Pedro Passos Coelho, no dia das mentiras, de que não ia mexer no 13º mês a provocar-me azia e a música do Bandemónio Pedro Abrunhosa a ribombar-me na cabeça: “É que isto é mesmo assim…)

 

Subsidiou-se o arranque e o plantio de vinhas, oliveiras, os poços de rega, o abate de barcos de pesca, os burros, as ovelhas, as vacas leiteiras, os cursos de formação onde professores chegaram a aprender a nobre arte dos tapetes de Arraiolos ou o ponto em cruz, onde se aprendeu a costurar, a jardinar, a cantar e, até, a respirar.

 

(E a promessa de Pedro Passos Coelho, no dia das mentiras, de que não ia mexer no 13º mês a provocar-me azia e a música do Bandemónio Pedro Abrunhosa a ribombar-me na cabeça: “É que isto é mesmo assim / Sou só uma ilusão…

 

Isto era o que se fazia lá fora, na Europa desenvolvida. E este argumento falacioso foi o bastante para calar muitos dos protestos dos que apelavam ao realismo e à razão. E os patriotas e os comentaristas de agora todos ajudaram à festa. Foi um fartar vilanagem. Claro que o dinheiro não bastava para a instalada megalomania dos direitos. Os subsídios foram-se extinguindo, mas os direitos continuaram e a riqueza nacional não crescia. Resultado, Portugal tratou o problema como de costume, pediu dinheiro emprestado. A ilusão do euro tornou essa experiência fácil, pelo menos aparentemente. E tinha a virtude de ser indolor nos primeiros anos.

 

(E a promessa de Pedro Passos Coelho, no dia das mentiras, de que não ia mexer no 13º mês a provocar-me azia e a música do Bandemónio Pedro Abrunhosa a ribombar-me na cabeça: “É que isto é mesmo assim / Sou só uma ilusão / Não tenho mão em mim…)

 

Mas os alicerces deste estado social têm, por força da falta de produção de riqueza nacional, a mesma consistência dos da baixa lisboeta. Também eles estão assentes em estacas de madeira numa zona de aluvião. E o terramoto aproxima-se.

 

(E a promessa de Pedro Passos Coelho, no dia das mentiras, de que não ia mexer no 13º mês a provocar-me azia e a música do Bandemónio Pedro Abrunhosa a ribombar-me na cabeça: “É que isto é mesmo assim / Sou só uma ilusão / Não tenho mão em mim / É uma maldição…)

 

Agora já sabemos que a economia é a modos que um conto dos Irmãos Grimm. E todos pressentimos que viver de dívidas não é sustentável.

 

(E a promessa de Pedro Passos Coelho, no dia das mentiras, de que não ia mexer no 13º mês a provocar-me azia e a música do Bandemónio Pedro Abrunhosa a ribombar-me na cabeça: “É que isto é mesmo assim / Sou só uma ilusão / Não tenho mão em mim / É uma maldição.” E o segundo e o quarto versos a rimar com aldrabão… E o PPC a cantar: Sou só um ilusão.)

 

PS – Mas enquanto o Titanic se afunda, permitam-me que deixe aqui uma sugestão aos homens… de boa vontade, para soçobramos com elegância.  

 

Ponham a tocar a “Sinfonia do Novo Mundo”, de Dvorák [para os especialistas Sinfonia Nº 9 em Mi menor (Op. 95)].

 

Roupa: Calções Cargo, relógio Diesel, saco Louis Vuitton (este pequeno pormenor anda pelos 2200 euros), cardigan em algodão, óculos de sol Persol, cinto em pele, sandálias também em pele, chapéu em palha Lacoste.

 

Bebida: Red Emotion, por sugestão do Hotel Ritz. 1 morango, 2 amoras, 1 framboesa, 3 gomos de lima, 4 cl de Bacardi. Técnica: Macerar os frutos, agitar tudo no shaker, coar bem, adicionar gelo picado e juntar Água das Pedras (por sugestão nossa), em vez de Água Castelo, até ao cimo. Decoração: Rodela de lima, amora e framboesa. Tempo de preparação: 8 minutos.

E bom naufrágio. 

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