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Por vezes o universo toma outro sentido. Sobra-nos no fim do verão um sorriso triste. A alma da cidade fica cada vez mais longínqua. Embalamos a chuva com os nossos braços já cansados. Todo o espaço é misterioso. Aproximamo-nos da metafísica das horas. Aí nasce a nossa ansiedade. Os nossos desejos balouçam. Ficam-nos os gestos. Os gestos que se abrem dentro do medo. A ausência. O estremecimento dos olhos. O abismo dos nossos lábios em riste. As horas arrastam os sonhos. As ideias ficam mais tranquilas. As tardes ficam eternas e adornadas de torpor. As sombras ganham ritmo e balançam. As fadas ficam tresloucadas e dizem sentir saudades dos gnomos e das noites voláteis e do som das badaladas da meia-noite e das estrelas e do luar. As cidades ficam sem horizontes. Onde se refugiou a esperança? Os sonhos estão cansados. Até os voos das aves entristeceram. Passou o tempo das asas simbolizarem liberdade. O erro mudou. Continuam a nascer e a morrer deuses. A eternidade é agora distinta. A fé vive a ilusão do seu próprio culto. Os desejos são fraquezas. As manhãs são agora dos outros. Deixámos de acreditar na esperança. Os sonhos vivem de noite. São invisíveis. Dormimos na utopia de existir. Nesse lúbrico espaço negro, nesse íntimo torpor do desaparecimento. Os símbolos perderam o seu significado interior. O silêncio cerca-nos. Converteram a magia em estátuas. Recordamos o som das águas lentas, a sua impaciência líquida, o seu sonho atrasado. Transformaram os jardins em desertos. Tudo é passado. Tudo ficou vago e incógnito. Já não nos guia a razão mas o tempo incógnito. A loucura acode-nos quando tentamos compreender. A verdade não tem poiso. Lemos a dor como se fosse ferro, mas é apenas um comboio de corda. As flores acordam nos canteiros e influenciam-nos com o seu disfarce. Misturamos o sonho e a realidade. Ouvimos brincar as crianças. A sua alegria continua a ser um enigma. Por isso acreditamos na saudade. O céu dorme enquanto chove. A sua vontade é como um sentimento cego. Grande mistério é a alegria da luz. No entanto os nossos momentos são escuros. Queremos acreditar de novo na felicidade, no seu sossego incerto. Os anjos erguem a voz. Deus dorme no seu silêncio. A solidão fica totalmente preenchida. E ostensiva. Despertamos do sonho de que somos feitos. Essa é a nossa dor mais antiga. É uma verdade falsa. É uma realidade de sombras. Já nos cansámos da mocidade e da sua falsa esperança. Agora seguimos as estações com o olhar e ficamos tristes com o pôr-do-sol. A tristeza sossega-nos a imaginação. Fingimos não compreender aquilo que compreendemos. A liberdade aprisionou-nos dentro do seu labirinto. Apesar disso, a liberdade, como a chuva, engrandece os caminhos por onde corre. Esse é o mistério das coisas. O sentido do universo é não ter sentido nenhum. Essa é a sua incrível razão de ser. Ilumina-se o tempo por dentro. O dia apaga-se. Os nossos olhos brilham como estrelas misteriosas. Sorrimos como se fossemos anjos anónimos. Abrimos as mãos que são as nossas janelas secretas. Por isso terminam em segredos.
A escritora Luísa Costa Gomes escreveu que o nosso sistema político, aparentemente, é uma democracia.
Mesmo a digníssima oposição é da confiança do governo.
Parece que até havia por aí alguns comunistas, mas comeram-se uns aos outros.
O povo, em geral, também é da confiança do governo.
Existe mesmo um processo formal de eleições de vez em quando.
A população é mansa e gosta muito de ditadores magros, austeros e do tipo paternal.
Defendem que a eficiência advém da ideia de que o chefe deve sobretudo propagandear para convencer.
O Português admira a propaganda acima de tudo, porque sabe que é um valor mítico que está fora do seu alcance.
Esta gente que está atualmente no poder conseguiu transformar a cultura em beberete de festarolas e futilidades.
Arranjaram maneira de que as denominadas feiras antigas, as passagens de modelos e os cozinhados sejam tidos como cultura.
Estão sempre a manipular.
No tempo de Salazar faziam-no através da ditadura ideológica, da censura, do silêncio e da violência.
Em tempo de democracia, violentam-nos com o chinfrim das gaitadas e com a sedução pueril da encenação do circo romano.
Está visto, o 25 de Abril não foi conduzido por gente preocupada em pensar, e repensar, Portugal, como era urgente fazer.
O Portugal profundo foi trocado pela Europa light e sedutora. Ninguém deu conta que os bolos e o champanhe custam muito dinheiro e são alimento de festas.
Os pilares da nossa sustentabilidade – agricultura, pecuária, silvicultura, têxteis, pescas, conservas, minérios e construção naval – foram destruídos pelo afã liberal, imposto de fora, que nos colocou nesta humilhante posição de estarmos sujeitos aos espirros da Alemanha e às constipações da França.
A visão deste governo, e dos seus apaniguados dispersos pelas cadeiras do poder autárquico, sobre o país e os seus quadros superiores, fazem-me lembrar a governanta de Alexandre Herculano, que uma vez disse a um jornalista: “O meu patrão não trabalha, passa o tempo sozinho a ler e a escrever. É um grande preguiçoso!”
Numa leitura profana, estamos em crer que o seu ícone de referência, pelo exemplo, será Jesus Cristo, pois não andou na escola, não cumpriu a tropa, não arranjou emprego, não teve filhos, nem constituiu família. Vivia até na casa de seus pais.
Foi crucificado dias antes de poder emigrar.
Deixem que, antes de terminar este escrito, vos lembre as palavras de Natália Correia, grande amiga e defensora de Sá Carneiro e Snu Abecassis: “De onde veio esta gente minúscula que nos quer comandar, feita não de sangue mas de números, não de nervos mas de fórmulas? São todos iguais, saídos de forma única, bonitos, apetecíveis por fora, medonhos, repelentes, por dentro. Cimentados a egoísmo, habita-os o gelo, impele-os a implacabilidade…»
PS – Diz o filósofo que o irresponsável também trabalha contra si mesmo.
Porque sabemos que nem o senhor presidente da Câmara de Chaves, nem os 3 vereadores do PSD, e muito menos o trio de vereadores do PS, trabalham para aquecer, e muito menos contra si mesmos, vimos mais uma vez solicitar a vossas excelências a aprovação de uma auditoria externa às contas da nossa autarquia, pois quem não deve não teme e à mulher de César… etc.
Admiro em ti essa poderosa arte da criação de expressões, essa maneira própria de formar gestos, essa intenção lúdica de extrair sons da ternura e do medo. Depois murmuras poemas antigos com os cabelos encostados aos vidros húmidos da janela. A chuva lá fora cai com violência. As pessoas lúcidas elaboram teorias da vida e do destino e dedicam-se a congeminar axiomas metafísicos e morais. Depois adormecem até ser madrugada. Essa é a fase espantosa do assombro. Estudamos agora as grandes extensões de terra, o mar sob o céu escuro, a duração dos dias e das noites, o voo duplo das gaivotas e dos corvos, o caráter subterrâneo das raízes. Procuramos tudo o que é efémero para lhe dar sentido. E a vida transforma-se numa duração ordenada exibindo alguns traços de divindade genial. As coisas olham para nós procurando vigiar-nos a inocência. Os horizontes tornam-se sucessivos e reproduzem-se revelando a sua forma material. Estudamos então a cidade com a atenção inquieta dos gestos. Tudo permanece intacto no meu desequilíbrio interior. Os poemas são demasiado equívocos e frágeis. A minha personalidade varia dentro dos seus limites. Toda a solicitação humana se torna imprecisa. As imagens do tempo remanescem imateriais. O vento levanta-se para o lado do mar. As janelas e o telhado da casa gemem a sua rigidez de madeira e barro. A solidão é novamente uma ameaça. Adormecemos sem arrependimento. Sonhamos a possibilidade de voltarmos a aprender a falar. A hora é de decadência e de espasmos. Os sentimentos transformam-se em palavras. O tédio desce das montanhas. As tempestades desenvolvem-se e desmoronam-se enquanto nos beijamos. Percorremos o esboço dos nossos corpos com a ponta dos dedos. Libertamos as nossas deliberadas obsessões. As lágrimas correm-nos pelos olhos. E exigem paisagens e fragmentos do céu e da terra. As palavras sentem-se inúteis e querem sair dos poemas. Homenageamos a antiguidade e o seu estilo memorativo, a reminiscência interior dos presságios, a ousadia dos olhares lógicos, a navegação das cópulas, o voo dos gestos, a celebração silenciosa da rutura, a intenção paranoica dos elogios, a origem das descrições, a espaçosa genealogia dos teus lábios, a extensa nomenclatura das imagens, o espírito reversível das metáforas. A cidade fica abstrata, os movimentos dos corpos fragmentam-se, o lirismo transforma-se num símbolo injusto. As palavras ficam cinzentas porque procuram evidências. As ondas entram pela porta do quarto como se fossem uma nova realidade filosófica. O mundo perde por momentos a sua qualidade poética. Toda a eternidade é arbitrária. As almas criam-se a si próprias e movimentam-se dentro da sua obsessão. O destino é uma intenção húmida. Os espíritos antigos tentam esclarecer a verdadeira natureza das profecias. Improvisamos o desassossego. Elucidamos os crentes da apócrifa memória dos poetas. Por fim, ganhamos o conhecimento absoluto da perplexidade.
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