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O destino chamou as terras que são só vales. As coisas novas caminham como o desejo. Continuo a perder-me no tempo. A eternidade escreve a lei da dissolução. Apagam-se-me os olhos quando não te vejo. Herdaste o verde dos jardins e o azul tranquilo dos céus resplandecentes. Foste regada com o orvalho de mil dias. Então as primaveras brilhavam sem queixume e os outonos eram como mantos de paz. Os poetas fechavam-se em casa reunindo imagens estrepitosas. As metáforas dançavam ao som de violinos transitórios. Mulheres novas criavam espaços de breve eternidade. Imprimiam-se então beijos e sorrisos. E o prazer habituava-se à dor. A saudade adormecia. Os mistérios acumulavam-se. Os bichos morriam. Em ti desaguava a opulência das brisas e a plenitude dos vales. Os sonhadores eram indolentes. Consumiam-se no seu próprio ardor. Aprendi a crer em ti, sobretudo quando inclinavas a face e sorrias devagar. Os montes expunham as suas veias. Aprendemos a compreender as imagens e os gestos. O tempo demonstrava a sua vaidade e tinha outro nome de que agora não me quero lembrar. As casas das aldeias estão cada vez mais sós. Os caminhos prolongam-se lentamente pela noite dentro. As encruzilhadas pressentem o medo do abandono. Antes, o futuro era imenso e plano como a eternidade. As figuras transformavam-se em destino. As coisas possuíam uma essência profunda. As palavras exibiam o seu esplendor. Tudo era novo, grande e forte. As terras estavam grávidas, as águas corriam fortes e as árvores eram gigantescas. Deus habitava fora das igrejas. As suas mãos eram como estuários. Os peregrinos sentavam-se nos jardins e cantavam. Os pássaros desdobravam as suas asas. Agora é a angústia que nos obriga a cantar. Os rios perdem-se sempre antes de encontrarem o mar. O escuro é muito mais profundo. Já não recebemos o brilho das estrelas. A verdade é como uma cidade cinzenta. As horas separam-se e transformam-se em seres hermafroditas. As noites tecem o seu silêncio em vigília permanente. A vida amadureceu sem darmos conta. Calculamos sempre as palavras como se elas fossem chorar. O tempo e os olhares inclinaram-se. As melodias continuam belas mas fecham-se dentro de si e tremem como se estivessem com febre. As folhas dos livros são agora como espadas. Os passarinhos continuam a cair dos ninhos empurrados pela sua angústia quase instantânea. Os mestres de agora nunca foram aprendizes. A saudade estende as asas na nossa direção. As palavras são agora como os sapatos altos, desprendem-se de nós com ostensivo desdém. Por vezes são como incêndios que devoram a beleza e os sentimentos mais longínquos. Os nossos olhos, de cansados, mal conseguem libertar-se da banalidade terna do dia-a-dia. Com as palavras amadurecemos o silêncio. Lá fora ainda há de tudo. Apesar dos anjos terem todos as bocas cansadas, ainda se brinca e canta. O tempo não larga os nossos braços. Os ciprestes enegrecem as alamedas onde já quase ninguém passa. O teu sorriso ligeiro acorda o perfume da esperança. Os teus olhos libertam-me da escuridão. As lendas que contas ainda sossegam as crianças. Continuo o menino angustiado que sempre fui.
Aparentemente possuímos mais liberdade individual, mas a sociedade onde vivemos está cada vez mais fora do nosso controlo e alcance. A partidocracia e os interesses económicos e financeiros sobrepõem-se aos interesses dos cidadãos. Manobram tudo e tudo e corrompem.
Vivemos neste neoliberalismo inspirado em Bernie Madoff, que por um lado nos rouba e por outro se dá ares de altruísta.
Tudo isto nos deve dar que pensar. Chegamos a uma fase da História em que o capitalismo assimilou a filantropia e a caridade, não apenas como idiossincrasia, mas como uma circunstância inerente ao próprio sistema.
A desigualdade cresce um pouco mais todos os dias. No entanto, para que o sistema não se desfaça, os mais ricos distribuem um quinhão aos mais desprotegidos, sabendo que essa é a melhor forma de reproduzir a situação que gerou esta brutal desigualdade.
O logro é esse. As elites criaram, e difundem, a ideia de que não existem alternativas ao poder que temos hoje.
Claro que para a crise que vivemos atualmente não existem respostas fáceis. Mas veja-se o que se passa na nossa cidade, em Portugal e no resto da Europa: os amblíopes lideram os cegos. Para esta gente, as políticas de austeridade são como uma superstição.
Todos sabemos que a austeridade apregoada, e praticada, é uma forma de evitar que possamos ir à raiz do problema da crise.
Incitam-nos com a pressa da atuação. No entanto, essa é a forma perversa de nos impedir que pensemos.
Os partidos no poder utilizam o argumento da crise para meter medo. Mas o que hoje todos percebemos é que eles foram o motor da crise. A sua principal razão.
Apesar dos mecanismos democráticos estarem a ser colocados em causa, não podemos desistir de ter esperança no futuro. Temos de perder o medo da mudança.
Mas, confesso, começo a ficar um pouco saturado da esquerda marginal que sabe que nunca atingirá o poder, mas, o que é ainda pior, secretamente nem sequer o deseja ocupar.
Os marxistas-leninistas e afins são os melhores teóricos do seu próprio falhanço.
Por incrível que pareça, e como muito bem referiu Slavoj Zizek, os neoliberais rejubilam com os comunistas. De facto, o caso da China é paradigmático e irónico. Os comunistas tornaram-se os agentes mais capazes do desenvolvimento do capitalismo.
Atualmente, o capitalismo asiático é mais dinâmico e produtivo do que o ocidental.
Os neoliberais deliciam-se com o feito. Afinal, quanto menos democracia melhor funciona o sistema. Com salários mais baixos e com menos direitos sociais, a economia desenvolve-se melhor.
Apesar de estar na moda ser antieuropeu, continuo a acreditar na Europa. As suas ideias de igualdade, liberdade, democracia e direitos humanos são a visão correta de uma sociedade livre e justa.
Os valores democráticos e republicanos são a sua matriz mais consistente.
Se a Europa se desvanecer e claudicar, quais são os princípios que os substituirão?
PS – Porque todos sabemos que quando se quebra madeira saltam lascas, renovamos o apelo ao senhor presidente António Cabeleira, e aos seus distintos vereadores, João Neves incluído por inteiro, para que aprovem uma auditoria externa às contas da autarquia. É que o buraco da dívida camarária é de tal dimensão que tememos que nos arraste a todos para dentro dele e nos devore. Além disso quem não deve…
PS 2 – E, também em nome da transparência, já agora senhor presidente, talvez fosse boa ideia aprovar conjuntamente uma auditoria externa às contas da JF de Santa Maria Maior, da qual foi insigne presidente, até 2013, o risonho vereador João Neves (ex-MAI e atualmente do PSD), pois quem não deve não teme; certos de que aquele que tão insistentemente reivindicou, durante toda a campanha eleitoral, uma auditoria às contas da CMC, com toda a certeza verá com bons olhos e até enaltecerá fervorosamente, uma auditoria realizada às contas do seu íntegro mandato.
Somos felizes quando voamos sobre a lisura da tarde e o tempo adquire a plenitude aquática do espaço. As casas retêm o envelhecimento. A noite caminha devagar, como a idade. É chegada a altura de nos despedirmos dos montes e da sua abstração verde. As aves dançam por cima da lucidez e abrem a eternidade ao mundo. As aves sulcam o azul e o esplendor das coisas. A base do seu voo é a nostalgia. O rio impõe as suas margens ao vale e vinca assim os pontos agudos da sua caligrafia alegre. O olhar puxa pela densidade que transportamos dentro de nós e fixa-se na transparência surreal dos barcos. A transcendência surge como a ponta de um véu invisível. Cumpre-se então o espírito das coisas. Lá ao longe deslizam as traineiras. A sua glória é pacífica. As suas quilhas rompem o nevoeiro que se espalhou sobre as águas. A bruma desprende-se dos pinheiros. O tempo fica tépido como se fosse em eco. Alguém dá brilho à solidão da aldeia. Com os nossos filhos vem a luz, a memória das suas brincadeiras, os seus olhos sorrindo, o amor fixado nos seus dedos como se fosse sal. A madrugada desfralda o rasto da luminosidade que deslumbra o mundo. A noite foi mais um esforço para não enlouquecer nas suas redes, nos seus sobressaltos. Sentimos a vacilação dos astros enquanto o mar recuava na praia. Aos poucos, a praça surge perante nós jubilosa e inquieta. As ondas profundas tornam o tempo agudo. Os pescadores vão rompendo o seu caminho. O mar redime-lhes os vultos. A claridade intensa da manhã transforma-se em movimento acústico. O sol amornece a lisura do rio. Uma brisa fresca sopra sobre a nossa idade. O tempo fica mais aberto refletindo a luminescência da chuva. Recolhemos o silêncio e o seu infinito imenso. Afinal os deuses estão vivos. E escutam. E sentem os nossos corpos acesos. E sentem ainda mais o peso íntimo da sua angústia. A idade costuma abrir caminhos e reconhecer nomes. Descemos o rio em paz. Na mesma paz que o rio costuma transportar. O azul do céu fica ainda mais azul e mais aberto como se fosse um buraco jubiloso. Submetemos as palavras ao voo abstrato dos livros e elas adormecem. O azul desce sobre elas como se fosse um anjo. Ainda confio no seu assombro. O largo da aldeia ondula por dentro como se fosse invisível. Em tempos foi como uma flor aberta. Possuía a eficiência da vida e deixava-se inundar de resplendor. A evidência do tempo matou-o. Tudo se perde na abóboda infinita do espaço e do tempo. As despedidas apagaram-se da memória de quem as viveu. Todos temos de cumprir o ímpeto inexorável do desaparecimento. A felicidade explicita-se no seu sinal de fronteira. É daí que nos escuta. Contamos os passos graves que a velhice nos obriga a dar, orientando-nos no seu esplendor vagaroso. A lucidez move-se dentro de nós como um réptil. A festa despede-se das pessoas e da tarde. Sentimos a sua gratidão como uma grande distância. As promessas ficam invisíveis. O trabalho ilumina-nos a paciência. Um enxame de luz transforma-se numa aragem. Com ela finda esta pequena eternidade. A nossa imagem fica de pé à espera de implodir. Ajustamo-nos ao interior da nossa incandescência. O tempo revela os vestígios das cicatrizes antigas. A verdade, a infância, o silêncio e o espanto crescem por dentro. Aí reside todo o esplendor do poema.
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