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Javier Marías, o autor de Os Enamoramentos, tem razão, há na escrita uma incompreensível autodisciplina. “Só quem é um pouco anormal é que se mete a trabalhar numa coisa sem que ninguém lho mande”.
Há um provérbio árabe que diz: “Aquele que corre sozinho tem a certeza de chegar ao fim.”
A verdade é necessário merecê-la. A vitória mais não é do que uma miragem na cabeça de estúpidos vaidosos. E a mentira é como uma lagarta escorregando nas pétalas de uma flor. Esta é a trilogia do desencanto.
Há pessoas que pensam que a realidade e a verdade são coisas diferentes. Eu, metodicamente, duvido. Ou melhor, talvez a verdade não exista, mas, mesmo assim, sei que existe o desejo de a encontrar, seja lá em que sítio for. O segredo está em não desistir.
Sou do tempo dos melodramas. Ouvi várias vezes mulheres apaixonadas contar que o cinema lhes provocava uma ânsia de morte. De morte pelo amor. Pela redenção do amor. Contavam a história da Amália, ainda nos seus tempos de vendedora de fruta, quando ia ao animatógrafo ver a Dama das Camélias, e depois de voltar do cais, se pôr de propósito nas correntes de ar para implorar a Deus que, pelo menos, lhe desse o dom da tuberculose.
Ai, a poesia, a poesia. Essa fé dos pobres nos poderes ocultos da poesia. Mas os poetas pobres ignoram que os pobres poetas se ajoelham perante os ricos.
Somos vítimas dos enigmas. E das verdades. Da verdade dos outros, que é muito diferente da nossa verdade.
Para podermos viver com alguma sanidade mental temos de ter daqueles ataques de abstração que nos permitem ver através das nuvens densas da demagogia. Está um tempo para políticos ébrios.
E depois sugerem-nos a esperança com palavras doces. A esperança na felicidade, essa ideia tão capitalista que nos persegue a vida inteira. O problema é que não existe alternativa à altura.
Já que os homens e as mulheres estão impregnados da sua saudosa infelicidade, pensemos, ao menos, na felicidade das máquinas, ou na felicidade da sua posse. Algum sentimento nos tem de ficar de todo este progresso.
A esperança que nos apregoam é como um casarão grande e bem iluminado que cada vez vai ficando mais pequeno à medida que nos afastamos dele, caminhando na desilusão premente que nos acompanha, e nos modela, os dias.
Este Portugal que amamos, mais por condição do que por que razão, podia ser como uma pequena casa parecida com as que existem sobre as encostas e possuem as vistas extensas. Mas não. A nossa pequenez é endémica, substantiva. Permanente. As nossas vistas são curtas. Demasiado curtas. Vai um tempo para políticos amblíopes.
Afinal, Roland Barthes morreu assassinado, segundo a tese claramente ficcional do novo romance de Laurent Binet. O móbil do crime residiu no facto do semiólogo francês estar na posse da “sétima função da linguagem” que permitiria “convencer não importa quem a fazer não importa o quê não importa quando…”
O estranho é que Barthes morreu atropelado por uma carrinha de uma lavandaria numa rua de Paris.
A 3 de Janeiro de 1889, em Turim, Friedrich Nietzsche sai de casa. Na rua encontra um camponês que luta contra a teimosia do seu cavalo, que não lhe obedece. O homem perde a paciência e começa a chicotear o animal. O filósofo aproxima-se e tenta impedir a desumanidade dos golpes entrepondo o seu corpo. Perde imediatamente os sentidos. É levado para casa onde permanece em silêncio durante dois dias. A partir daquele trágico acontecimento Nietzsche nunca mais recuperará a razão, ficando aos cuidados da sua mãe e das suas irmãs até ao dia da sua morte, a 25 de Agosto de 1900.
Vivemos num mundo precário que teima em nos roubar os costumes e as tradições. Vivemos num tempo onde até as amabilidades são teóricas. Onde as ilusões e as desilusões ocorrem ao mesmo tempo.
Cheguei a pensar que o futuro ia estar sobrelotado, afinal parece que vai ficar vazio. É triste assistir impotente ao vazio dos nossos campos e das nossas aldeias que ardem durante o verão e congelam no inverno.
Segundo o livro A Demografia e o País: Previsões Cristalinas sem Bola de Cristal, da autoria dos investigadores da Universidade de Aveiro, Eduardo Anselmo Castro, José Manuel Martins e Carlos Silva, na faixa do interior do país que vai desde Trás-os-Montes ao Alentejo, a manter-se a atual tendência da evolução do índice de fecundidade em Portugal e não havendo migrações, as previsões apontam para a perda de aproximadamente um terço da população atual, em 2040.
A tudo isto assistiremos sentadinhos e risonhos numa cadeira Eames.
É tempo de apagar o fogo das minhas fantasias e de me concentrar no delicioso assombro dos teus olhos. Libertei-me do absorto estigma dos escolhidos, do resoluto caminho dos louvadores, da reverente distância dos poderosos. O meu caminho é outro. Persigo o desejo insensato de acelerar a letargia do tempo. Os sonhos movem-se em pesadas carroças que andam por caminhos silenciosos. A pele greta, os olhos queimam-se. A memória transformou-se em vários elementos dispersos. Os corpos conservam a sua frágil armação. Muitos deles são agora pálidos frutos estéreis. É a lei da vida. Louva-se o esquecimento que avança através das pedras e da excelsa estirpe dos séculos. São ainda vastas as janelas da madrugada. É inebriante o orgulho do tempo. Os humanos conquistaram os territórios com a confusão das guerras, fazendo submergir as estátuas mais violentas. Acenderam-se fogueiras nos caminhos, já cicatrizaram os lamentos, mas os deuses defensores da fé redentora continuam insaciáveis. Pregam-se doutrinas antigas, as águas da verdade são misturadas com a história gordurosa. Alguns homens enfunam-se de soberbo prestígio e morrem sem acreditar na impúdica evidência da mortalidade. Andamos com os sonhos às costas percorrendo os caminhos de sempre sem sequer nos apercebermos da frescura do vento que anuncia a tarde. As andorinhas vigiam as nossas insónias. A paz e o tempo diluem a memória dos mortos. Sinto-me como um agricultor plantando eucaliptos na areia de uma praia. Os faunos acendem as luzes nos bosques para atraírem as fêmeas mais jovens. Elas levantam os vestidos e mostram a sua nudez. E gemem. Os seus corpos são brancos. A água do rio lavará as impurezas e renovará as fontes do desejo. É a lei da vida. A incredulidade tem sempre um motivo. A felicidade não. Os guerreiros dos sonhos esperam há anos pelas suas cavalgadas mais furiosas, arrancando-nos do leito durante a madrugada. Começa assim a longa viagem dos pesadelos. O musgo cobre as paredes. Criaturas esquecidas habitam as ruínas. Nos pátios das casas aninham-se as sombras. Os dias são cortados pela lâmina das horas e ficam mais finos. Uma chuva insistente faz crescer a erva da dor. Os carris dos comboios que marcavam a terra e definiam o trilho oxidaram de maneira irreversível. Pisamos o pó da arca perdida. Os pássaros e os poemas fogem para longe. O seu ruído detém-se quando nos aproximamos. Lembram-nos palavras do passado, o seu espectro pálido, a chave que abre a porta das memórias, a solidão das construções antigas, os signos da transformação, os navegadores silenciosos, a divergente orientação do desprezo, a desordem do céu, a razão e o seu esquecimento. As crenças mais firmes transformaram-se nos desejos mais insatisfeitos. É a lei da vida. A cortina da janela ofusca-nos a vista da fúria das aves. Moderamos a voz, o orgulho e o desejo. Dissolvemos mais um pouco a esperança. Continuamos a desconfiar da serenidade das árvores mais frondosas, da condição do tempo, da verdura e da sua aparente maturação, dos sonhos mais detalhados, das lentas cerimónias da glorificação. Há muito que a música se calou. O vento lá fora continua a varrer o passado. Sem descanso. A vida continua a oferecer-nos o teorema delicado dos afetos e a ensinar-nos a irrevogável lei do desaparecimento.
Atualmente já não faz muito sentido falar em esquerda ou em direita. Talvez por isso é que o prestigiado sociólogo António Barreto, que foi militante comunista, depois socialista, e hoje navega um pouco “mais à direita do que há 30 anos”, se define “politicamente de esquerda clássica e do centro-moderado. Se estiver muito deprimido, concluo que sou como um camaleão: ora de esquerda, ora de direita (…) A minha mais profunda convicção e a maior energia da minha vida é tentar ser um camaleão”.
A velha máxima de que o socialismo levava à abundância jaz morta e enterrada nos livros das prateleiras dos perseguidores de utopias.
Precisamos como de pão para a boca de uma organização política que tenha uma solução de governo e propostas alternativas diferenciadoras que permitam desbloquear a atual estado de inércia e apatia, este empate confrangedor entre o PSD/CDS e o PS.
A coligação PAF (PSD/CDS) quer vender-nos a ideia de que se continuarmos por este caminho de silvas, arbustos, buracos e pó de seguida chegaremos a um Portugal desenvolvido. Foi esta a senda do progresso de Salazar e deu no que deu.
Já o PS opta por outro filme. Pretende indicar-nos o caminho de mais investimento de modo a criar crescimento e com isso atingirmos o ponto de rebuçado, mas sem sacrifícios desnecessários e com mais justa distribuição dos rendimentos. A mesma receita de Guterres e Sócrates, agora com uma que outra injeção de penicilina por causa das infeções provocadas pela troika.
Já os milagreiros, e justiceiros, do PCP e do BE insistem na cassete de que não é necessário qualquer tipo de austeridade. Os comunistas tradicionalistas colocam mesmo a hipótese salvífica do abandono do euro, para dessa forma construirmos um país pobrezinho, mas honrado, onde reine a igualdade.
Ou seja, nenhum nos fala com verdade. A realidade é outra coisa.
Uma coisa é certa, o país está à beira do desfalecimento.
O nosso país, durante pelo menos, a última década, foi tomado de assalto pelos profissionais da política, pessoas cujos currículos foram construídos exclusivamente ao serviço das estruturas partidárias, para onde entraram quando jovens e aí aprenderam a arte da submissão, da traição e do seguidismo. Tal rapaziada não conhece outra maneira de estar na vida.
Assistiram à forma de vida dos seus antecessores, à maneira como sobrevivem. Os que mandam são seguidos pelos que obedecem para amanhã serem eles a mandar.
Marinho Pinto, no seu livro Mudar Portugal, conhece-lhes os principais atributos: “Subserviência, traição, conspiração, jogadas palacianas numa versão do maquiavelismo primário da política são a Bíblia de muitos dos políticos portugueses que, sobejas vezes, acabam a governar o país.”
O PSD, o CDS e o PS, não podem ser a alternativa deles próprios. A opção tem de vir de fora, de organizações políticas cujos dirigentes têm as mãos limpas, o coração independente e não se sujeitem aos proventos ardilosos dos grupos de interesses instalados na nossa sociedade.
Como defende Marinho Pinto, a frontalidade “não é, mas devia ser, uma arma política. A arma política que tem sido seguida em Portugal é a manha, o viés, o cinismo, a hipocrisia, a mentira. Mentiras que toda a gente sabe que são mentiras, mas que convém aceitar-se como verdades. O estranho é as pessoas acharem que mentem muito bem e os mentirosos não serem punidos.”
Está na hora dos portugueses recompensarem os políticos frontais, os que não possuem duas caras, os que não se ocultam atrás de máscaras, os que sabem que se andarem à chuva molham-se.
É já tempo de mandar embora esta gente que nos governa, que se serve da política e do Estado em vez de os servirem. É daí que tiram, direta ou indiretamente, os seus rendimentos, que de outra forma nunca conseguiriam.
São indivíduos sem escrúpulos, sem honra e sem verdade. São gente a quem a política permitiu, e permite, aumentar o património que nunca conseguiriam adquirir em condições normais, exercendo uma profissão no mercado de trabalho, que muitos não sabem, nem nunca saberão, o que de facto isso é.
Está na hora de castigar nas urnas os políticos que dizem sempre o que as pessoas querem ouvir, mas que de facto não sentem. Prova disso é que depois de chegarem ao poder não fazem nada do que prometeram.
Está efetivamente na hora de mudar Portugal e votar num partido que seja uma verdadeira alternativa democrática que se baseie, uma vez por todas, na verdade, na honestidade e na decência política. Temos de mudar de rumo e caminhar numa nova direção.
O caminho com os de sempre leva-nos inevitavelmente ao abismo. A política tem de ganhar de novo o sentido de serviço público, que nunca deveria ter perdido.
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