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TerçOLHO

Este é um espaço dedicado às imagens e às tensões textuais. O resto é pura neurastenia.

TerçOLHO

Este é um espaço dedicado às imagens e às tensões textuais. O resto é pura neurastenia.

10
Mai18

Poema Infinito (404): Criação de espaços

João Madureira

 

 

 

Construímos o dia como uma torre de pedra onde podemos meditar ao crepúsculo. A sua plenitude é tranquila. Perfeitos são os campos e as ervas altas e as flores e os arbustos e o riacho que corre por dentro da penumbra verde destacando o teto arqueado da folhagem. Podemos agora dizer que o olhar do construtor encontrou finalmente a sua própria extensão. O tempo demonstra o seu mutismo, guarda o seu próprio espaço, trabalha a sua esplendorosa tranquilidade. A meditação é outra forma de eloquência porque contém em si o excesso de energia e a densidade calma da matéria. Elaboramos interrogações porque nos disseram que a vida está intacta. A realidade exterior passou a manifestar-se de forma circular. O segredo reside na relação simples entre o corpo e o espaço, entre a paisagem e o desassombro, entre o ser e o olhar. A realidade não está no interior do sujeito, apesar da intimidade permanecer fechada dentro da obscuridade dos labirintos. O vasto silêncio da tua boca revela-se através do fogo silente do teu olhar. Os lábios parecem um novo instrumento de escrita, descrevendo o desespero da espera, a libertação dos sentidos, a voracidade audaz das vaginas, a consagração do silêncio, a esperança redonda dos teus seios, a assimetria angulosa das cores, o humor das árvores, a subversiva ternura da juventude, o incêndio dos corpos, o horizonte interno da terra. Alguém abre a porta do tempo com tenazes de fogo. Alguém grita dentro da sua nudez completa. A vertigem de escrever é branca. As palavras ardem dentro da boca. Deus escreveu de novo com nitidez milimétrica a origem de tudo, a criação completa. Espanta-me a minúcia da tua boca, os campos sombrios, a forma incendiada do teu corpo. Revela-se a luz na forma entusiasmada das folhas, na lentidão perpendicular dos corpos, nos olhos dos anjos, na consciência explosiva das palavras, na infinita fragilidade da vida, na consciência do desejo, no acumular das sombras, na respiração dos montes, na designação esplendorosa do vazio, na imperfeição dicotómica do amor. Olho para os campos com a lentidão de quem os quer esquecer. Deixo-me ir devagar, percorrendo o caminho incendiado da infância, observando a impercetibilidade dos insetos, a respiração brilhante dos lagos, o embranquecimento das profecias, a virgindade intemporal das árvores, a velocidade iluminada da rotação da Terra, a raiva ordenada da perspicácia, as margens obsessivas dos rios, a inanição da poesia, as esquinas invisíveis da pobreza dos bairros, as referências absolutas do irreal. As sombras das montanhas são agora mais altas. O teu corpo é agora mais lúcido. As frases são agora mais frágeis. Os ecos são mais distantes e a água mais árida. Conseguimos ouvir o ar atravessar transversalmente as palavras. As distâncias adquiriram novo sentido. O tempo parece mais íntimo. A profundidade, essa, continua infinita, como os olhares que se abrem e fecham por dentro. A proximidade dos corpos ficou mais longínqua. Estamos no centro do tempo, no centro do silêncio. O espaço das palavras é agora mais vazio. Respiramos melhor quando nos sentamos à janela e ouvimos a música das varandas, o ruído amplo da verdura, a simplicidade vagarosa do desejo. A tua serenidade cria um novo espaço dentro de mim.

07
Mai18

391 - Pérolas e Diamantes: A falácia da corrupção dos políticos e banqueiros ou é tudo boa gente...

João Madureira

 

 

Os militantes dos partidos, sobretudo os do PSD e do PS, são gente muito crédula, talvez por isso tenham preenchido a ficha de adesão pensando que assim iam mudar as freguesias, os concelhos e o país, porque para mudar o mundo lá estão os revolucionários do PCP e do BE. E para reformar o céu existe a Assunção Cristas e os benzidos do CDS.

 

Também as crianças creem no Pai Natal, com o desfecho que todos conhecemos: em dezembro todas recebem, pelo menos, um brinquedo.

 

Também eu me fiei nas duas epifanias com os resultados que são públicos.

 

Só os ingénuos é que acreditam que a corrupção existe no nosso país.

 

Todos sabemos que os tribunais continuam a perder tempo e dinheiro a julgar portugueses suspeitos de corrupção perante a passividade de todos, sobretudo dos militantes e simpatizantes dos partidos do sistema. 

 

O escândalo não está na corrupção, mas sim naquilo que ocorre nos tribunais, pois continuam a insistir na tentativa de encontrar um português corrupto, até porque é mais do que evidente que não existe um único que seja.

 

Os pouquíssimos condenados, foram-no por pequenos equívocos ou por grandes enganos. Um deles esqueceu-se de declarar às Finanças o valor dos robalinhos enfiados num cesto rústico com que foi agraciado por contribuir para o combate à poluição do alumínio e do ferro-velho. O outro não se lembrou de declarar o dinheiro que tinha na Suíça e que lhe servia para pagar os charutos que fumava enquanto pensava e exercia o poder. Conseguindo até fazer as duas coisas ao mesmo tempo.

 

O dos havanos chegou mesmo a ser visitado, no seu retiro prisional e espiritual, por um ex-presidente da República que lhe manifestou a sua solidariedade e proclamou aos sete ventos a sua inocência.

 

E tanto assim é que o povo voltou a elegê-lo com uma votação expressiva. O crime, afinal, pelo menos em Portugal, não compensa.

 

O que não sabemos é quando este clima de suspeição sobre os políticos vai acabar. As mentiras são mais que muitas. Até o “Expresso”, uma espécie de “Correio da Manhã” semanal, se deixou instrumentalizar na divulgação de notícias falaciosas.

 

Só pode ser pura paranoia noticiar que o Ministério Público investiga 11 anos de contas bancárias de Manuel Pinho (ex-ministro de José Sócrates, esse paladino da amizade, já que ninguém conhece no mundo uma única pessoa que tenha um amigo tão generoso e altruísta como o engenheiro Santos Silva), pois existem indícios de que o ex-governante tinha quatro offshores.

 

Dizem, as más-línguas, claro, que Manuel Pinho terá recebido meio milhão de euros do GES enquanto governava.

 

Também Ricardo Salgado, o Midas português (ou Messias da banca, se preferirem) foi constituído arguido no caso EDP, pois, ao que parece, terá recebido mais dois milhões de euros de José Guilherme, por causa do crédito a um empreendimento ligado ao construtor.

 

Já Tomás Correia é suspeito de ter recebido milhão e meio de euros. O que só pode ser atribuído ao delírio especulativo dos jornalistas do “Expresso” e à maldade do MP.

 

O advogado de José Guilherme garante que o empresário se limitou a cumprir instruções de um amigo “a fim de garantir o futuro dos netos”, transferindo para uma conta que lhe foi indicada a quantia citada, mas desconhecendo que ela pertencia ao sr. dr. Tomás Correia.

 

Veem, o Pai Natal existe mesmo, mas não é lá muito equitativo. Aos nossos filhos, ou netos, dá-lhes brinquedos, mas aos filhos e netos dos nossos tímidos empresários oferece-lhes um pé-de-meia de meio milhão de euros. E, discreto como é, nem diz nada aos legítimos proprietários das contas bancárias.

 

Segundo o MP, o esquema entre Tomás Correia e Ricardo Salgado consistia no inventivo procedimento de um emprestar para o outro lhe dar.

 

Foram gestos deste tipo que fizeram com que José Guilherme pagasse a Ricardo Salgado catorze milhões de euros, justificados como um “presente”.

 

Pedro Santos Guerreiro, o suspeito e mal-intencionado diretor do “Expresso”, armado em esperto, atreve-se mesmo a concluir que nem é preciso “chegar à suspeita de corrupção, basta a suspeita de que Manuel Pinho recebeu dinheiro enquanto era ministro. Nunca tinha visto isto”. Ou então, “que se acumulem dois subsídios e se diga sem rir nem corar que isso é eticamente irrepreensível, é muito mais do que salvar a pele”.

 

Ora esta última tirada é direcionada a esse herói da democracia, do socialismo e da autonomia insular, que dá pelo nome de Carlos César, que, por puro acaso, é presidente do PS e membro do Conselho de Estado.

 

Os jornalistas do “Expresso” chegaram até a ousar fazer as contas e o atrevimento de dizer que César lucra mais de 300 euros com cada viagem aos Açores. Nos últimos dois voos, que realizou entre Lisboa e a Região Autónoma dos Açores, o lucro terá chegado aos 732 euros. Ou seja, por cada viagem a casa, Carlos César e os outros deputados dos Açores e da Madeira, têm lucro. 

 

Dizem por aí as más línguas do costume, com os jornalistas à cabeça, que os deputados do continente também demonstram comportamentos idênticos, conseguindo obter, com a mesma eficácia, o mesmo tipo de lucro. Mas para palavras loucas orelhas moucas.

 

Isto acontece sempre que os senhores deputados, magnânimos representantes do povo português, levantam o Subsídio de Mobilidade atribuído aos residentes nas Regiões Autónomas e aos que dizem morar fora da cidade de Lisboa, mesmo que residam a quinhentos metros da Assembleia da República.

 

Isto a juntar à ajuda de centenas de euros que recebem para custear as deslocações. Mas nestes, como noutros casos, há sempre uma ovelha ranhosa.

 

Não nos admiramos se, em breve, um incógnito deputado for objeto de um processo disciplinar por infringir as regras habituais, ou, então, por se armar em esperto, recusando prestar declarações falaciosas. Ele há gente capaz de realizar os gestos mais incríveis para conseguir dar nas vistas.

03
Mai18

Poema Infinito (403): A brancura invisível do ar

João Madureira

 

 

Saí para a cidade e ela desvaneceu-se. Desaparecer continua a ser surpreendentemente fácil. As pessoas fazem tudo para abandonar a própria identidade. Chegará o tempo de as palavras não conseguirem sair de dentro de nós. Dizem que os deuses já começaram a escurecer. Agora é inverno. As noites são mais longas. De manhã, a luz penetra em nós filtrada pela neve. Já passou o tempo dos loucos gloriosos. O braço mecânico do tempo mexe-se na direção correta. O medo torna-se mais forte do que a necessidade. O chão parece assustado. Os corpos oscilam como os sinos. As recordações são cada vez mais duvidosas. O vento cai de súbito sobre nós. Andamos em círculos. As máquinas começam a soluçar. Nós não reagimos. Procuramos as entranhas luminosas do tempo. Só os corpos sentem dor. A escuridão faz-nos sentir ansiosos. As árvores agitam-se obstinadamente. As suas folhas parecem colonizadas pelo ar glacial. O teu rosto continua fascinante e triste. Pareces uma pessoa imaginada envolta num grande sorriso. Os desaparecidos ganham peso enquanto nós vamos ficando mais vazios. O inverno parece incapaz de nos devorar. Lembro-me de flutuarmos num ar branco de encontro à luz frágil dos edifícios. As palavras continuam a chegar, acumulando-se ao nosso redor, como neve. Algumas são tão leves que se desvanecem rapidamente. São como nós: pó de estrelas. Começo a perder a tua linguagem e a recordar as palavras das orações. Uma coisa é certa: os invernos são mais fiéis. A paisagem adquiriu a precisão dilacerante de um quadro de Seurat. O pai-nosso afetou-a do mesmo modo físico que o vento norte. Só perto de Deus se sente a sublimação das alucinações. Houve tempo em que fomos agressivos como a luz quebrada pelo mar. Éramos jovens improváveis. Recorríamos aos gestos em vez de usarmos palavras. As forças convergiam antes de adormecermos embalados pelo ritmo obsoleto da Internacional. A minha paixão integral vai toda para Bach. As frases musicais assumem a aparência de palavras. E as palavras aparecem-nos como formas geométricas. Seurat transforma-se em fragmentos brilhantes. As fantasias de agora estão todas encaixadas no real. Por vezes, as palavras desaparecem dentro do seu próprio sentido. Formam-se então  buracos negros no pensamento. As substâncias cinzentas envolvem o núcleo da substância branca. Existe dentro da nossa cabeça uma espécie de assimetria, um desequilíbrio entre as palavras e as imagens. As mãos acenam na direção das paredes vazias para chamar os quadros de Van Gogh. Do seu interior sai um exército de pinceladas azuis e amarelas. Aprendi, sem querer, a ser demasiado analítico, a não compreender o lado efémero das coisas. Ensinaram-me então a monitorizar a delicadeza, a traduzir a música em representações matematicamente complexas, a pormenorizar os ritmos e as paisagens urbanas, a processar o momento sagrado das fotografias. Foi então quando o nosso mundo interior mudou. O nosso mundo interior faz agora parte do universo. O tempo é como um rio que se move de forma efémera e aleatória. Nada permanece sem alteração. Hiroji ensinou-me que o número possível de estados mentais é superior ao número de partículas elementares no universo. Afinal, o que é a loucura?

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