490 - Pérolas e Diamantes: A democracia e os soluços
Por vezes dizemos que não queremos aquilo que verdadeiramente queremos.
Faz parte da ambição dos mais ambiciosos dos ambiciosos querer saber tudo, dispor de tudo, poder tudo e tudo alterar.
A autoridade competente é muito veloz. Muitos inteligentes, quando se perdem nos caminhos das serras dizem que foi porque elas mudaram de lugar.
Alguns gritam pela lei, pela lei que lhes assiste. A verdade é que cada um tem a sua lei. Há os que são bons a fazer e a executar. Existem outros que são bons precisamente no contrário. A esses escolhemo-los para produzirem as leis que são muito ao jeito de ordens.
Por alguma razão será que quando estamos com soluços costumamos engolir o ar.
O interessante nunca está na partida e muito menos na chegada. Mas na travessia que fazemos.
O problema maior são os judas.
A mim, as despedidas provocam-me uns princípios de febre.
Apesar de nada ter arranjo, é bom não nos deixarmos invadir pela tristeza. O que não tem arranjo, arranjado está.
A verdade é que não posso estar mais de acordo com o que escreveu Camilo José Cela. Penso amiúde “que as ideias religiosas, morais, sociais, políticas, não são senão manifestações de um desequilíbrio do sistema nervoso. As ideias e os escrúpulos... são um estorvo.”
Para se fazer história o melhor é não ter ideias, assim como para se fazer dinheiro é obrigatório não possuir escrúpulos.
E o comunismo foi chão que já deu uvas. Como diz Svetlana Aleksievitch: “Comunista é o que leu Marx; anticomunista é o que o percebeu.”
Por isso é que o capitalismo continua a explorar e a emprestar aquilo que lhe sobra.
Quando chove muito, o habitual é a água do rio sair do seu leito. Quando a chuva para, ela logo torna ao seu lugar.
Uma coisa já sabemos, depois de lermos muitas páginas de história: jamais os poderosos coincidiram com os melhores.
E a Democracia? A nossa putativa Democracia, como vai ela? Pois não está bem, nem está mal. Está. E como está, então deixá-la estar.
A verdade é que a tal Democracia vai falhando aos poucos, sem que ninguém saiba explicar lá muito bem porquê. Os mais inteligentes, muitos deles sentados nas cadeiras do parlamento, nas do governo ou das câmaras municipais, pensam vagamente nela (como se fosse sua esposa) e no que poderia ter sido e já não é mas ainda pode vir a ser se a conjuntura internacional o permitir.
Esta democracia parlamentar só mesmo de lingerie é que lá vai. Ou não. Quarenta e tal anos de vida expõe a maturidade. Se o nosso Fascismo era a puta pobre, a nossa Democracia é bem capaz de ser a meretriz nova rica.
Sim, o nosso PM é um homem de boas intenções, daqueles que continuam a teimar em redigir propostas políticas como se fossem poesia altruísta.
Claro que há em tudo isto patranhas, má organização e erros. É até possível que os bancos funcionem defeituosamente. Mas temos de reconhecer que a barafunda está controlada.
A verdade é que a nossa Democracia quase parece democrática, solidária, tolerante, participativa, representativa. Quase parece. Quase.
A verdade é que também a cenografia condiz com a realidade. E ainda a música, as roupas e os cenários. O espetáculo, temos de convir, até está bem montado. A geringonça, tal como a passarola de Bartolomeu de Gusmão, é uma boa alegoria.
Só que, por vezes, tanta criatividade pode incentivar o desperdício. É preciso ir com calma.
A nossa Democracia é uma junção entre fantasia e maquinaria, entre filosofia e religião, entre música de feira e música clássica, entre mitologia e realidade. Passamos de um país sorumbático a um país exótico. Até a nossa capital se transformou numa de feira popular destinada aos turistas. E as cidades de província em stands de feiras do fumeiro e produtos artesanais sem marca registada.
Tudo é interativo. Até a estupidez. Pois a estupidez, tal como as gorduras, só faz mal se exagerarmos.
A nossa Democracia é feita essencialmente de palavras. De bonitas palavras. Há lá palavra mais bonita que democracia! Palavras que nos transmitem agradáveis emoções. Há lá emoção mais agradável do que a que nos provoca a Democracia. Sobretudo a sua invocação. A invocação democrática. E a vocação. Há lá coisa mais apelativa do que a vocação democrática!