Feira dos Santos - Chaves
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Haiku nº 12: As chuvas de verão / encheram / o lado desconhecido do rio
Deixem que dedique algumas palavras a esta complexa personagem. Wilhelm Canaris foi mesmo um dos verdadeiros enigmas da guerra. Sir Stewart Menzies, o chefe dos serviços secretos britânicos, definiu-o mais tarde, e passo a citar, como “o raio de um valente e um verdadeiro patriota...”, o que é um elogio estranho e enigmático vindo de um inimigo. Sir Stewart sabia, certamente, daquilo que falava.
Há gente que defende ter sido Canaris um líder da resistência antinazi e mesmo um espião britânico. Apesar de o argumento ser surpreendente e altamente improvável, existem provas suficientes de que o almirante alemão terá tido contactos suficientes com Menzies para que sérias dúvidas sejam colocadas acerca do papel que desempenhou nas misteriosas trocas de informações que se terão realizado entre britânicos e alemães “não nazis”. Ou seja, a importância destes contactos obscuros entre o Abwehr e o SIS pode muito bem ter influenciado o resultado do Dia D.
Foi através da completa compreensão dos métodos profissionais aplicados pelos serviços de informação alemães, e ao auxílio prestado pela capacidade de leitura de tráfego de mensagens das máquinas Enigma, que a LCS logrou manipular a capacidade de avaliação das equipas germânicas responsáveis pela vigilância das operações que envolviam o Dia D, como também manipular a capacidade de avaliação das equipas germânicas responsáveis pela vigilância das operações que envolviam a sua preparação e, ainda, forçar Von Roenne e toda a equipa dos seus serviços a fazer precisamente aquilo que os Aliados pretendiam que acontecesse, ou seja, uma estimativa fatalmente errada num momento verdadeiramente crítico.
No entanto, não podemos inferir que Von Roenne tenha sido um incompetente oficial dos serviços de informação. Longe disso. Foi sempre voluntarioso e idealista. A sua participação no atentado a Hitler aí está para o demonstrar. Além disso, o seu registo anterior a 1944 era excelente. Talvez tenha cometido o pecado de permitir que a confiança que tinha no seu próprio sistema se tenha sobreposto às dúvidas e o tenha levado a esquecer a necessidade de recorrer a análises críticas. Além disso, a avaliação proporcionada pelas fontes foi interrompida, ou ignorada, ou, então, ficou saturada devido a uma operação de logro levada a cabo pelo inimigo, que tinha conhecimento da forma de ludibriá-lo.
Quando colocaram as questões cruciais (Os Aliados vão invadir? E, em caso afirmativo, onde, quando e com que forças?), o pessoal dos serviços de informação alemães procedeu de forma completamente equivocada. E esse erro determinou as ruínas de Berlim e o colapso do “Reich de Mil Anos” de Hitler. São raras as ocasiões em que uma má avaliação realizada pelos serviços responsáveis pela recolha e análise de dados tenha tido consequências tão graves.
Lenine sabia muito bem o que era o terrorismo. Ele próprio foi um ideólogo e um aplicador dessa ideologia. Foi ele quem disse: “Mata um – aterroriza dez mil.” O seu camarada Estaline, um praticante exímio do terrorismo de Estado, teorizou ainda melhor: “A morte de um é uma tragédia; a de um milhão, uma estatística. Lenine que refletiu muito tempo sobre o assunto do terror do Estado concluiu que “o propósito do terror é, simplesmente, aterrorizar”.
(continua...)
Para ali estão as sardinheiras plantadas em panelos inúteis, com ar de despojos dos dias em abandono, evidenciando uma estrutura geométrica feita de grandes folhas verdes. Os tesouros estão agora a monte. O oiro em pó pega-se aos dedos. Os caixilhos derretem-se. O pátio condensa o calor agonizante. E nós para ali a sofrer. Os velhos abrem a boca apavorados pela tristeza. Já não me lembro de quem semeou, ceifou ou mondou as courelas. Os montes aprenderam a gostar da solidão. Neles apenas Lot fala com os anjos. Bebo os comprimidos do esquecimento com a ajuda da água do São Caetano. Depois ergo o braço esquerdo e a seguir o direito para tentar rezar. Mas não consigo. Apenas vejo o rosto do pai e a sua tristeza branda. A casa perdeu os seus cheiros. A sala é muito mais pequena, quase não cabendo dentro da sua instabilidade. A água do rio reflete o céu. E o seu profundíssimo infinito. O novo tempo traz outras palavras. E borboletas. E sombras. E o jogo do berlinde. E ninhos de pássaros abandonados. Noutros tempos chegava o Natal e a entrada da casa iluminava-se e ninguém pensava na morte. Íamos à missa e à adega e ao forno buscar o pão acabado de cozer. O quarto cheirava a maçãs. A infância era sol e terra húmida. As sombras alastravam-se e as tardes adensavam-se. E eu lia o jornal à procura de significados. A mãe tratava dos coelhos, das cevas e das galinhas. A vermelha chocava os ovos dentro da velha cesta. No carnaval escondia-me dentro de casa a ler histórias de príncipes e princesas que se repetiam como se fossem cromos de futebol. O amor era um sítio escondido. Comecei a descobrir a vida secreta das imagens. E a olhar e a sentir o subtil prazer do espírito. E a admirar o sentido limitado dos sólidos e a dimensão diáfana da paixão. A luz faz a cor. A virgindade habita sempre uma sala vazia. Sinto-me agora mais longe do voo das aves. Já não sonho de olhos abertos. Quando agora escrevo, começo a sentir o pensamento a desfalecer. As flores continuam a arder dentro dos meus olhos. O fogo regressa ao seu início. Encontro Kandinsky atrás da porta a brincar com a orelha de Van Gogh. As árvores começaram a perder a euforia da primavera. A luz desabrocha. Escolho ver os cometas que estão presos nos olhos da mãe. Antes de se despenharem. As brasas espalham-se pela lareira. A avó costumava dizer que as trevas estão antes do batismo. Eu subo a memória degrau a degrau. A luz transfere-se para a água e depois para o ar. O pensamento faz parte da biografia da eternidade. Da sua quietude e das suas moléculas. Os braços da escuridão atravessam a vida em sofreguidão. O caos desfaz os objetos complexos. As árvores amadurecem de tanto esperar. O nome de batismo é uma espécie de estrela do norte. Lembro-me de me fixar no seu umbigo, antes da minha namorada se despir. De baixar as calças para me consentir. Não a queria ferir. Nomeei-a suavemente. Os sexos ardiam, mas as pontas dos dedos pareciam pedaços de gelo que apalpavam botões de flor como se pudessem ferir. As glicínias começavam a florir. Sentia-se o seu perfume em declive. As coisas bravas são oblíquas. Já o amor é paralelo. O sofrimento também pode ser um ofício. A ausência não dá tréguas. A tua fé afeta-me. Vejo passar o tempo como um rio calmo. E eu desfaço-me por dentro. A calma da foz está sempre antes da fúria trágica dos oceanos.
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