Vilar de Nantes - Corpo de Deus
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1 - A pandemia veio revelar um mundo profundamente desigual e onde estão a emergir novas formas de autoritarismo ligadas ao negócio, ao lucro, ao mercado e que não hesitam em sacrificar os mais fracos em nome da velha lógica da acumulação de riqueza e de chorudos lucros. E aí estão novamente as velhas e inquietantes tendências antidemocráticas. E voltaram formas dissimuladas de vigilância política e de vigilância social. É claro que tem de existir um equilíbrio entre direitos e segurança. Mas temos de evitar que em nome de uma qualquer espécie de segurança, comecemos a espezinhar os direitos e as liberdades.
2 - O Boss é um tipo benévolo. Tanto ouve o ascensorista como o piloto do seu jato particular. Essa é a sua forma de combater o tédio e o sentimento de incomunicação. Apesar de ser extremamente rico, possui alma de anarquista. Apesar da hipnose provocada pelos ziguezagues constantes e do seu ar belicoso, o Boss tem convicções firmes. Gosta da flexibilidade e não de pessoas que têm uma ideologia e por isso vão contra uma parede de tijolos pela teimosia de uma proposta quando podem muito facilmente alterá-la. Por causa das coisas, contratou um sósia da sua altura para proceder aos despedimentos. O Boss não acredita nem no nacionalismo, nem em qualquer outra filosofia política. Ele é a criatura do seu próprio ego. Uma vez, o secretário-geral da ONU, António Guterres, teve a coragem de lhe recusar um encontro onde o Boss iria fazer uma doação significativa a instituições sob a jurisdição dessa organização internacional. Ele disse: “Julga-se o Nelson Mandela? Ele que se foda, não é líder nenhum. Nem ele, nem o zulu.” A verdade é que o Boss é bom a gerir o caos, pois não necessita de gestão. Tem pouca paciência para ler relatórios e ouvir explicações complexas. Prefere antes interromper, fazer perguntas e arrastar-se em monólogos. À pouca vontade em aprender, soma-se a falta de conhecimentos. Tem o mesmo procedimento da Máfia, fala sempre de negócios em código. O seu staff é muito fluente na linguagem que o Boss usa para fazer exigências e comunicar desejos. Usa inferências, acenos de cabeça, silêncios, eufemismos e sinais. Ele não só conhece mafiosos, como faz bons negócios com eles. Romantiza-os. É um batoteiro, até no golfe.
3 - Há pessoas que são sempre assim, tímidas e com ausência de vaidade, fazendo com que muitos as julguem bichos do mato ou, até, gente distante e antipática. Mas não, são pessoas mesmo assim, dignas e que fazem com que o mundo não se afunde. Parece que a cobardia continua a ser apanágio de gente dita séria e importante. Muita dela agacha-se atrás das palavras que aprendeu de cor. Os seus elementos mais apalermados gostam mesmo de dizer que militam ao lado dos salvadores do mundo. Mas mais não são do que pessoas desinteressantes e muito chatas. Eu fujo dos ditos salvadores como o Diabo da Cruz. Sobretudo quando começam a elogiar o creme de galinha e a dizer que os poetas se alimentam de criatividade e pétalas de rosas.
4 - Está escuro lá fora. Estou acordado há muito tempo. O treino é uma coisa de astúcia. Do outro lado ouço vozes. Todos estamos cheios de retórica clerical e política. Cheios de trivialidades. E de comprar pedaços de bondade humana. Andamos tão preocupados com a crise mundial que nos esquecemos da nossa. Os extremamente idealistas são mesmo assim. O lixado mesmo é ultrapassar os ataques incapacitantes da ansiedade e da depressão. E também dos avaliadores de personalidades. Aiô Silver, avante! Não sou nenhum herói. Demasiado batimento cardíaco. O que derrota os intelectuais é o Princípio de Peter. Esse Demónio que não existe.
5 – “A arte grita liberdade”, diz o artista chinês Ai Weiwei. E poetisa, lá do meio da sua rutura: “Quando restringimos a liberdade, ela levanta voo e pousa num parapeito.” Reconheço-me nas palavras de Lídia Jorge: “Enquanto muita gente gasta grande energia com o desdém pela vida, os escritores, mesmo quando falam com desdém, são pessoas com um instinto salvador.” Até porque “a arte é, de facto, uma revolta contra a história”.
6 - Até porque, se eu fosse o Salgueiro Maia tinha…
7 - Mas essa minha intenção fica para um próximo livro.
Houve uma época em que o sol atravessava as paredes e eu tomava café com leite sem o mexer para comer o açúcar que ficava por dissolver no fundo da xícara. Notava a minha palidez refletida na minha mãe. Esse sol ofuscante ainda chega das horas da infância. O pai e a mãe estão do lado da sombra. Não consigo deter estas imagens que começam a fugir através de um tempo semelhante ao espaço. Quero crer nessas imagens. Depois de o nevoeiro se dissipar, o olhar mergulha de novo na extensão cheia de fantasmas. Perseguem-me pesadelos imóveis. O sonho torna as coisas longínquas. As más recordações sacudo-as como o faz um cachorro quando sai da água. Sinto ao contemplar as coisas, sejam elas belas ou feias, o mesmo prazer que os outros experimentam quando as tocam. E a Teresinha lá vai trigueira, pelo meio dos raios de sol definidos pelas nuvens, pequena, mas luminosa. Eu agora estou na sombra. A existência atual está contaminada até às raízes. Os homens usurparam o lugar das árvores e dos bichos, poluíram a atmosfera e limitaram a maioria dos espaços livres. Estamos a ficar sem sítio, sem lugar, sem justificação. As feridas arrefecem e ficam encobertas pela neblina. A luz do mundo é agora coada pelo fumo dos carros e das fábricas. Parece que ninguém quer ser salvo. Ficam de mãos abertas a tentar apanhar o vazio. Saio da tarde e entro na solidão. As aves parecem véus. Alguém apaga de vez o distante pulsar da infância e salta para fora da janela, como se fosse um anjo. Um falso sossego começa a subir pelas paredes. Anoitecem as pontes. A luz fria dos vitrais começa a gelar, como se o universo tivesse iniciado agora a contração definitiva. A voz grave de Deus explica que o mundo não tem centro. Queimo as flores secas que estavam no vaso enquanto as traças ciciam. A terra apenas aguarda pelo fulgor da manhã e tudo voltará a ser o que era. Existirão horas luminosas e regressarão os sonhos e nascerão crianças e as sereias dançarão com os anjos mudos. Flutuam no ar éguas e príncipes e pêndulos. Ao demónio o que é do demónio. Os que nos irão trair começam a confessar-se e a esconder os pecados debaixo da língua. O desejo fica escuro. Tentamos aprender a misteriosa linguagem dos astros através das suas fulgurações cintilantes. O medo termina a sua obra. As mãos apagam os gestos e a leveza da cintilação das estrelas. O nosso olhar perde os sorrisos e a floresta de luzes. Houve horas luminosas dentro desta casa, onde cabia o amor e os suspiros e as palavras que ficavam por dizer. Não encontro nada no meio do sossego, nem o rasto das tuas perguntas, apenas sardinheiras secas e memórias. O mundo fez-se em silêncio. A solidão arrasta-se pela casa, armadilhada pelo sono e atormentada pelo silêncio, perseguindo a cauda como se fosse um cão. A solidão adaptou-se à geometria e à longitude das memórias, criando uma nova espécie de saudade. O vento espalha os versos como se fossem folhas de outono. Ouve-se o rumor da erva a crescer, tal é o silêncio. As sombras têm medo delas próprias. Estendo as mãos sobre a noite. O teu corpo treme. Para lá das paredes está a cinza, a líquida luminosidade da alva, as frágeis e eternas arestas do tempo. A nossa nudez está cheia de presságios, de gestos crepusculares. A vida enche-se e esvazia-se de mistérios, independentemente da nossa vontade. Este caminho é todo interior.
A viúva de Wagner transformou Bayreuth numa espécie de templo para um grupo de seguidores dedicados a cultivar a memória sagrada do mestre. As opiniões desse grupo eram de um antissemitismo raivoso, chegando a interpretar as óperas de Wagner como opondo heróis nórdicos contra os vilões judeus, embora a sua música pudesse ser interpretada de muitas outras maneiras.
As duas figuras de proa do círculo de Bayreuth eram Ludwig Schemann, um intelectual que tinha traduzido o tratado do francês Joseph Arthur de Gobineau sobre a desigualdade racial para alemão, e o inglês Houston Stewart Chamberlain, que desposou umas das filhas de Wagner e publicou uma biografia elogiosa do grande compositor.
Cosima e o seu grupo de amigos difundiam as suas ideias através da publicação mensal do boletim Bayreuther Blatter, enquanto Schemann viajava pelo país falando em reuniões antissemitas e fundando distintas organizações racistas radicais, nomeadamente a Sociedade Gobineau, em 1894.
O seu sucesso foi limitado, mas a difusão das ideias do teórico racial francês por Schemann contribuiu muito para consagrar o termo por ele inventando (“ariano”) nos meios racistas alemães. Esta designação, originalmente usada para denotar os antepassados comuns dos falantes de línguas germânicas como o inglês e o alemão, começou a ser utilizado devido ao argumento de Gobineau segundo o qual a sobrevivência racial só podia ser garantida pela pureza racial, que estava supostamente preservada no campesinato alemão ou “ariano”, e que a mistura racial resultava num declínio cultural e político.
Mas o maior impacto resultou do livro de Chamberlain, Os Fundamentos do Século XIX, publicado em 1900, obra vaporosa e mística, onde o autor retrata a história em termos de luta pela supremacia racial que tinha mantido a sua pureza original num mundo de miscigenação.
Segundo Chamberlain, os cultos e heroicos alemães tinham pela frente os implacáveis e tenebrosos judeus, que não deviam ser menosprezados como grupo marginal ou inferior, elevando-os ao estatuto de ameaça cósmica à sociedade humana.
Na sua perspetiva, a luta racial estava ligada a uma luta religiosa.
Grande parte do livro tenta provar que o cristianismo era essencialmente germânico e que Jesus, não obstante todas as provas em contrário, não era judeu.
O livro de Chamberlain impressionou muitos leitores, pois apelava à ciência para justificar os seus argumentos.
O autor de Die Grundlagen des Neunzehnten Jahrhunderts desenvolve a fusão do antissemitismo e do racismo com o darwinismo social.
O cientista inglês Charles Darwin afirmou que os reinos animal e vegetal estavam sujeitos a uma lei de seleção natural na qual os mais aptos sobreviviam e os mais fracos ou menos adaptados morriam, garantindo dessa forma o melhoramento da espécie.
Os darwinistas sociais aplicaram este modelo à raça humana. Foi dessa maneira que se fundiram alguma ideias-chave posteriormente adotadas pelos nazis.
O antropólogo Ludwig Woltmann, em 1900, aventou que a raça ariana ou alemã representava o apogeu da evolução humana e, por isso, era superior a todas as outras. Disse ele: “A raça germânica foi escolhida para dominar a terra”. Mas existia um problema: as outras raças estavam a impedir que tal acontecesse.
Em 1912, o general Friedrich von Bernhardi disse que a guerra era “uma necessidade biológica”. Escreveu num seu livro que “sem a guerra, as raças inferiores ou decadentes abafariam facilmente o crescimento dos rebentos saudáveis e seguir-se-ia a decadência universal.
O antissemitismo e a higiene racial foram os componentes principais da ideologia nazi.
Heinrich Schartz e outros académicos alemães difundiram a ideologia dos irmãos de armas através de diversas publicações, mas a maior influência desta ideologia foi sobre o movimento juvenil, no qual os jovens, na sua maioria da classe média, faziam caminhadas no meio da natureza, cantavam canções nacionalistas à roda da fogueira e desdenhavam da política bafienta, da moralidade hipócrita e do artificialismo social do mundo dos adultos.
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