Furtivos e desconfiados
Há-os por aí aos pares. Mal deixaram o ofício e subiram alguns degraus na escala social, ficaram mais corrompidos que os tecidos atacados pela traça. A sua simplicidade aparente desabou de repente em singela ostentação de dinheiro e carros. Agora disfarçam a inutilidade debaixo de fatos azuis bem engomados e de cabeleiras pardacentas, que dizem ser fruto do desgastante desempenho das suas grandes missões para as quais foram ungidos pelos seus. Tornaram-se naquilo que detestavam. São agora furtivos, desconfiados. Baseiam a sua conduta na conveniência social dos seus superiores, apenas papagueado o que os outros pretendem ouvir. Defensores intransigentes do diálogo, agora só guardam lugar para o monólogo. Entre o povo exprimem-se por interjeições vociferantes. Espreitam os outros por detrás da sua conveniência egoísta. Regozijam-se com os fracassos alheios, defendendo-se com a sua complacência cívica. Dizem-se responsáveis, mas são apenas antiliberais colaborantes, sem ideias e sentimentos nobres, porque os trocaram por rogações e ladainhas. Se não fossem seres irrisórios, mereciam ser vexados em público.
Apesar de engordarem a conta bancária, esvaziam a sua consciência, que outrora foi livre.