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Set06
Sem título
João Madureira
Hoje encontrei o José, um rapaz da minha idade que já não via há muitos anos.
Está praticamente igual. Parece que o tempo não passa por ele.
Claro que está um pouco mais gordo, mais enrugado e mais calvo, mas, fora isso, parece praticamente igual ao que foi.
O José era muito castiço. Tinha muita piada.
Sabia tocar um pente com um papel imitando uma trompete, cantava como o Joe Cocker, imitava a bateria dos Deep Purple com a boca, travava os seus carrinhos de brincar no tempo certo e com um chiar muito característico.
Fora isso, queria ir para polícia. Só que imigrou para Espanha.
E já não me apetece escrever mais nada sobre o José, nem sobre nada. Estou irritado, apetece-me rasgar o computador e quebrar um disco de fado. Estou muito irritado e mal disposto. Até me doem os dentes. Também me apetece dizer asneiras.
Apetece-me dar um pontapé num gato, ou num cão.
Estou muito arreliado. Até me doem os joelhos e os pés.
E este tempo ainda me põe mais irritado. Chove e brilha o sol. Onde já se viu tal estupidez. O barulho dos carros enfurece-me.
Tenho uma borbulha no nariz.
Estou numa pilha de nervos. Tenho de ir cortar as unhas.