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TerçOLHO

Este é um espaço dedicado às imagens e às tensões textuais. O resto é pura neurastenia.

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13
Abr15

235- Pérolas e diamantes: Nasrudin e o jerico

João Madureira

 

 

É cada vez mais inquietante a insatisfação e o desânimo que tomou conta dos portugueses e, particularmente, dos transmontanos. É preocupante a descrença que se instalou na política e nos políticos e a falta de confiança no Estado e nas instituições democráticas. Estas frustrações e deceções levam inevitavelmente à apatia, ao conformismo e à decomposição da própria vida democrática.

 

Daí o desprezo dos portugueses pela mediocridade dos bonifrates do momento, que passam depressa da prudência dos bastidores para as luzes da ribalta.

 

É tempo de conferir de novo à política a sua plena dimensão ética e de enfrentar, sem complacência, todas as mistificações em que os tempos que correm são pródigos.

 

Se não é possível mudar os partidos, mudemos de partido. Apoiar e votar nos mesmos que nos levaram por três vezes à pré-bancarrota é rematada estupidez.

 

Depois dos constantes escândalos públicos que são noticiados todos os dias envolvendo os principais partidos do Bloco Central dos Interesses (PSD, CDS e PS) e escutando as desculpas esfarrapadas dos principais visados onde declaram que são insultos à sua pessoa, é caso para concluir que a verdade no nosso país se tornou um insulto. 

 

A vulgaridade da política portuguesa acolhe sem distinção falsidades, mitos, suposições, invenções e lérias. Alguns têm mesmo o atrevimento de apelidar tudo isto de bom senso. E mesmo que assim fosse, convém lembrar, como muito bem o faz Mário de Carvalho, que “o senso comum confirma, não interroga; acata, não discute; conforma-se, não se rebela; repete, não indaga”.

 

Daí a prisão preventiva de José Sócrates, as dívidas de Passos Coelho ao fisco, a incrível história dos submarinos de Paulo Portas, a espantosa licenciatura de Relvas, os aforros inauditos de Cavaco Silva, os mirabolantes robalos de Armando Vara. Lá diz o velho ditado chinês: “Quando a árvore cai, espalham-se os macacos.”

 

Com razão se tratavam os jovens espartanos à fome, avisando-os: “Roubem, mas ai de vós se fordes apanhados.” Eram outros os tempos. A perícia está em infringir a lei sem que o crime seja notado. Seja em cinco euros, cinco mil euros ou em 5 milhões de euros depositados em bancos espanhóis. Ou suíços. Ou luxemburgueses.

 

Então cá pela província, vemos a maioria dos nossos políticos (devidamente assessorados por gente de tal maneira ignara e hilariante, a discorrer sobre os mais diversos assuntos sem a menor reflexão) remeter-nos de imediato para “a personagem do rei Artur de Mark Twain discorrendo sobre a árvore das cebolas” (Mário de Carvalho – Letras sem Tretas).

 

Ainda com a ajuda de Mário de Carvalho, lembro a imagem dos nossos dignos autarcas semelhando um tal pastor de almas americano que um dia proclamou: “Para quê ensinar outras línguas na América se a Jesus bastou o inglês?”

 

Por isso é que o poder procrastina (literalmente “deixa para amanhã”) e a oposição faz o mesmo. O alegado poder cumpre a função de dramatizador e a suposta oposição completa a peça com o papel de desdramatizadora.

 

Por isso é que a mim me saem textos, um pouco à Machado de Assis (por favor perdoem-me a tola imodéstia), com a tinta da galhofa mas com a pena da melancolia.

 

As desculpas esfarrapadas do autarca da minha terra tentando justificar a enorme falta de coragem, para não lhe chamar outra coisa, em autorizar uma auditoria às contas da Câmara que gere, ou a ignomínia que representam os esgotos a céu aberto em Vale de Salgueiro-Outeiro Seco, como se estivéssemos numa vilazeca marroquina, lembra-me uma das imensas histórias de Nasrudin (um filósofo e sábio populista turco, lembrado pelas suas histórias engraçadas e anedotas).

 

Um dia recusou-se a emprestar um burro a um vizinho, com o pretexto de que o tinha cedido a um primo seu. Ainda a desculpa estava a ser dada quando o burro começou a zurrar atrás da porta da corte. O vizinho, como é normal, zangou-se e disse: “Mestiste-me.” Nasrudin replicou: “Estou indignado. Acreditas mais em mim ou no jerico?”

 

 

 

PS – Tchékhov dizia que “a arrogância é uma qualidade que fica bem aos perus” (ou talvez aos pavões que são aves de cauda mais vistosa). Por isso, mais uma vez solicitamos ao senhor presidente da CMC e aos seus distintos vereadores, que aprovem uma auditoria independente às contas da nossa autarquia. Quem não deve não teme.

 

PS 2 – Em nome da transparência, já agora senhor presidente, talvez fosse boa ideia aprovar conjuntamente uma auditoria externa às contas da JF de Santa Maria Maior.

 

PS 3 – Era um ato de coragem redentora, o senhor presidente deixar-se de desculpas de mau pagador e pôr fim ao deplorável espetáculo dos esgotos a céu aberto em Vale de Salgueiro – Outeiro Seco.

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