253 - Pérolas e diamantes: a ignorância sincera e o conhecimento
Foi passeando com um amigo e observando alguns olhares que nos observavam, que me lembrei de uma passagem do livro de Svetlana Aleksievitch, O Fim do Homem Soviético, onde a autora explica que foi na cozinha russa (khruschoviana) onde se iniciou o declínio e a morte do sistema soviético, vulgo comunismo. “Ali nasciam ideias, projetos fantásticos. Contavam-se anedotas. As anedotas floresciam! Comunista era aquele que lia Marx, o anticomunista era aquele que o compreendia.”
A isto se reduziu um dos mais brilhantes sonhos políticos do século XX: à anedota. Pelos vistos, a política vale pouco a pena. Os políticos, todos eles, ou quase todos, não são merecedores do nosso respeito e muito menos da nossa atenção.
No entanto eu penso que existe ainda alguma réstia de esperança. Pequena, é certo, mas, apesar desse trilho estreito, talvez ainda valha a pena não desistir de toda a política e de todos os políticos.
Tal como Vladimir Nabokov, “nada me aborrece tanto como os romances policiais e a literatura de intenções sociais”, e, acrescento eu, os políticos do “centrão" partidário português: Passos Coelho, Paulo Portas e António Costa.
Os três fazem-me lembrar um aluno citado por Nabokov, no livro Opiniões Fortes, que, ao ler um romance, gosta de saltar passagens “para fazer a sua própria ideia do livro, e não ser influenciado pelo autor”.
Continuando a citar Nabokov, igualmente “os meus desejos são modestos. Os retratos dos chefes de governo não devem exceder em tamanho um selo dos correios”.
“Para ser franco – e o que vou dizer agora é uma coisa que nunca disse antes, e espero que provoque um arrepiozinho salutar – sei mais do que posso exprimir em palavras, e o pouco que posso exprimir não teria sido expresso se não soubesse mais.”
A citação é inteiramente dedicada a todos os estimados leitores que gostam de fazer inferências. Esta e a que vou incluir no fim deste artigo.
É a modos como uma pequena homenagem que vos presto, já que não posso oferecer medalhas pela vossa persistente e zelosa leitura.
Mas voltemos à política e aos políticos. Aos do “centrão”, claro está. Aos outros que Deus os ajude e a mim não me desampare.
Rui Machete, um homem do PSD que anda na política vai para quarenta anos, e que o dizem ministro deste governo, afirmou que “não se reforma o Estado apenas fazendo fusões entre instituições”. É caso para perguntar o que andou este senhor a fazer durante perto de 40 anos à frente dos destinos da pátria. Ele e os eus companheiros de partido.
Em editorial, o Público diz que entre outros aspetos relevantes, o PS impôs um “compromisso ético” aos seus candidatos, proibindo o lobbying e a participação em “negócios do Estado”. É caso para perguntar se o PS não estará à beira da extinção. E porquê?, perguntará quem nos lê. Pois façam os prezados leitores as respetivas inferências, pois desta vez é por aí que estamos a caminhar.
Em pleno período estival, e também eleitoral, Marco Paulo está de volta com um videoclipe gravado em Kaxaça, no Montijo. Será para mais uma vez lembrar aos portugueses que devem continuar a votar nos seus dois amores PSD/PS? Espero bem que não, pois esse amor já deu o que tinha a dar: pré-bancarrota e austeridade.
Até ao dia das eleições, estou em crer que não faltarão trocas de acusações entre os dois líderes do PSD e do PS, que cada vez mais nos fazem lembrar a dupla de polícias do Tintim, Dupont e Dupont.
Só que desta vez à sua volta estão os denominados pequenos partidos que poderão, e deverão, penso eu, ter um papel fundamental na constituição do futuro governo, pois ao que tudo indica, nem a coligação nem o PS obterão maioria absoluta.
Estamos em crer que mesmo na penumbra, e sem tanto protagonismo mediático, os pequenos partidos, sobretudo o PDR de Marinho Pinto, poderão vir a ser os grandes vencedores das próximas eleições.
Volto de novo À Vida e Opiniões de Tristam Shandy, de que tanto gosto, sendo que, o papel do tio Toby deve ser reconhecido como “o bom povo português que vota de olhos fechados nos de sempre”.
“– Entendeis vós a teoria desta matéria (infinidade, presciência, liberdade, necessidade)? – Inquiriu o meu pai.
– Eu não, disse o meu tio.
– Mas tendes vós alguma ideia, insistiu o meu pai, daquilo de que estais a falar?
– Não mais do que o meu cavalo, respondeu o meu tio Toby.
– Santo Deus! – Exclamou o meu pai, olhando para cima, e unindo as duas mãos, – há tal valor nessa vossa ignorância sincera, irmão Toby, que seria quase uma pena trocá-la por conhecimento.”