380 - Pérolas e diamantes: O dilema
Em 2018 comemora-se o bicentenário do nascimento de Karl Marx, coautor, com Friedrich Engels, do Manifesto Comunista, a bíblia, ou o alcorão, se preferirem, dos revolucionários de todo o mundo durante mais de um século.
O que hoje conhecemos como marxismo-leninismo tornou-se dogma do Estado Soviético e de todos os verdadeiros revolucionários seus sucessores, como Mao Tsé-tung, a meados do século XX, e Fidel Castro, em 1959.
Mas todo esse esplendor dos amanhãs que cantavam implodiu com as revoluções de 1989/91. A queda do muro de Berlim arruinou a crença no comunismo global.
Karl Marx nasceu em Trier, na Alemanha, a 3 de maio de 1818. Era filho de um advogado judeu. Como se costuma dizer agora, o jovem Marx radicalizou-se quando estudava em Bona e Berlim. Passou a década de 1840 a lutar “contra o estado cristão da Prússia”, no papel de agitador e jornalista. Fugiu para Londres após as abortadas revoluções europeias de 1848/9, conhecidas atualmente como a “primavera dos povos”.
O Manifesto Comunista, terminado em 1848, mais não é do que a quintessência intelectual desta fase da sua vida.
O Manifesto descreve o denominado espírito insaciável do capitalismo por “uma constante expansão do mercado para os seus produtos”, disseminando-os “por toda a superfície do globo”. Segundo Marx, foi esta exploração global que impôs um caráter cosmopolita à produção e ao consumo em todos os países, conseguindo que a indústria ultrapassasse os espaços nacionais.
Para o filósofo alemão, “a burguesia, durante o seu reino de poucas centenas de anos, criou forças produtivas maiores e mais colossais do que as de todas as gerações anteriores”. No fundo, Marx estava a falar da globalização, vendo-a como um fenómeno potenciador da revolução mundial.
Por incrível que pareça, o autor do incompleto O Capital, viveu durante as décadas de 1850 e de 1860 do dinheiro proveniente da “exploração capitalista” efetuada nas fábricas de algodão do pai de Engels, em Manchester. Foi também esse dinheiro que proporcionou a Marx, e à sua esposa, o estilo de vida burguês a que aspiravam “para bem dos seus filhos”.
Mas foi Lenine quem começou a desbravar caminho para o triunfo das ideias de Marx. Para isso, em vez de divulgar os grossos livros do mestre que ninguém lia, usou o trunfo do panfleto político.
Em Imperialismo Fase Superior do Capitalismo, Lenine alega que, tendo o mundo mudado desde os dias de Marx, a teoria também tinha de mudar.
Por isso, Lenine decidiu atacar. Levou a cabo um golpe de estado bolchevique contra o que era o sentir da maioria do povo e até dos seus camaradas. E condescendeu mesmo em assinar o humilhante tratado de paz de Brest Litovsk.
Sucedeu-lhe Estaline, o expoente máximo da política externa dualista, pois chegou a assinar um pacto de não agressão com Hitler, afrontando todas as “verdades” instituídas pelos marxistas-leninistas. Nunca a história tinha registado ato tão vil entre dois ditadores tão brutais.
Sucedeu-lhe Nikita Khrustchov, que tentou tornar a sua pátria parecida com o capitalismo americano.
Seguiram-se algumas múmias até ao aparecimento de Mikhail Gorbatchov, um reformista impaciente, que decidiu abandonar o dualismo pragmático. As suas grandes reformas originaram o desmantelamento da velha ordem soviética sem, no entanto, ter uma ideia concreta de como a substituir.
Em 2017, a Rússia faz parte integrante da economia global, apesar de evidenciar uma versão do capitalismo oligopolista e inerte.
Vladimir Putin, apesar de não ser comunista, considera que a Rússia, tal como nas eras czarista e soviética, necessita de uma liderança autocrática para não cair na anarquia.
Apesar disto tudo, o dilema de Marx mantém-se. De um lado, assistimos à fecundidade do capitalismo global na criação de riqueza. Do outro, é visível a redução do trabalhador a um pequeno fragmento de pessoa que arrasta atrás de si as promessas de uma vida instável, sem futuro e com um salário que chega à justa para sobreviver. Quando chega.