415 - Pérolas e Diamantes: A instabilidade protocolar de D. Duarte Pio
Duarte, duque de Bragança, afirmou aos jornais que o presidente Marcelo atua como se fosse um rei. De facto, é difícil defender a monarquia com um Presidente da República tão popular.
O nosso putativo rei considera que um presidente que atua como se fosse um rei é um ótimo presidente. Já os maus presidentes são aqueles que têm um comportamento contrário àquele que teria um rei.
O que seria melhor para os portugueses era mesmo ter verdadeiramente um rei em vez de um bom imitador.
Pio, confirma que o sr. Marcelo atua como se fosse um rei, até porque é “uma pessoa inteligente, culta, com uma boa formação ética e percebe aquilo que o povo português gosta de ter num chefe de Estado”. Percebe-se o elogio.
Só que depois estende esse panegírico ao general Ramalho Eanes, que era uma pessoa muito metida em si, com cara de pau, recatado e homem de poucos sorrisos e ainda menos palavras. D. Pio considera que, se ele reinasse, seria o monarca dos afetos, pois possui a mesma proximidade do sr. Marcelo quando se desloca à província a visitar os seus súbditos.
Quando inquirido sobre qual seria a vantagem de termos um rei em Portugal, D. Duarte, em vez de definir a “sua” monarquia, atacou virulentamente a primeira República e elogiou veladamente a República de Salazar.
A primeira porque foi feita de revoluções e golpes. A segunda, a de Salazar, foi, na sua opinião, “paz e tranquilidade e um certo progresso económico, mas em regime não democrático”. Já a terceira, a atual, voltou à democracia e com ela “regressou a instabilidade económica e política”.
Parece óbvio que a “sua” monarquia se aproximaria muito da segunda República, apesar do pequeno detalhe da falta de democracia.
Deduziram, os jornalistas, que D. Duarte Pio não aprecia o 25 de Abril. Resolveram mesmo questioná-lo sobre isso. Ele, o nosso putativo rei, respondeu: “Eu respeito e simpatizo com o idealismo de muitos oficiais que fizeram o 25 de Abril mas, de facto, houve uma ingenuidade muito grande. Uma falta de preparação política enorme” provocada pela segunda República.
Para ele, o maior pecado da segunda República nem sequer foi “o regime não democrático”, mas sim a circunstância de “não ter preparado os portugueses para a vida política”.
Um dos muitos defeitos desta nossa República “instável” é o desperdício.
Seguiu-se a crítica ao poder autárquico: “O país está cheio de rotundas e de obras monstruosas.”
Também acha um desperdício de dinheiro, ou melhor, considera um luxo fazer autoestradas e coisas desse género. O melhor mesmo era andarmos de burro ou nas caleches de antigamente, atravessando a galope os caminhos de terra, em que cada viagem era uma autêntica aventura.
Critica ainda o défice de formação, sobretudo o défice de formação clássica. Afinal, por que razão a democracia acabou com os liceus e escolas técnicas?
Deu como exemplo de educação técnica “os bombeiros que têm uma formação muito baixa e muitas vezes acabam por ser vítimas dessa situação”.
Duarte Pio, apesar de aristocrata, no seu dia a dia vive com poucos luxos. Viaja sempre em classe turística nos aviões e usa os transportes públicos. Apenas no comboio vai em primeira classe. Por vezes também apanha o 28, no Chiado, mas com cuidado, pois há por ali muitos carteiristas.
Uma vez, nos Restauradores, no meio da multidão sentiu uma mão enfiada na sua gabardine e deu um grito ao homem. Ele disse: “Ai, desculpe, não vi quem era.” Agora, os carteiristas do 28, já o cumprimentam. Não há como conhecer os ladrões para não se ser roubado.
Revelou que não vota nas eleições presidenciais nem nas eleições para o Parlamento, apenas costuma votar nas autárquicas, porque considera que o que interessa é a qualidade pessoal do presidente da Câmara e não a etiqueta partidária com que ele vai concorrer.
Mas a República ainda não conseguiu resolver um problema premente. Nesse sentido, houve uma petição apoiada por personalidades tão relevantes como Lobo Xavier ou Rui Moreira pela inclusão do Duque de Bragança na Lei do Protocolo de Estado.
Essa petição, organizada pela Casa Real, tem vários motivos. Um deles tem a ver com os convites oficiais, tanto ao nível do Governo como ao nível de Câmaras, ou outros. Nunca ninguém sabe onde o devem colocar.
Para nos inteirarmos do problema que implica essa lacuna no Protocolo, deu um exemplo paradigmático.
Nas cerimónias fúnebres do presidente Mário Soares, nos Jerónimos, as meninas do Protocolo, pois o próprio protocolo protocola que devem ser meninas, puseram-no na quarta fila, com os embaixadores. Depois, veio uma senhora do Protocolo, já um pouco fora dele, e levaram-no para a segunda fila. A seguir veio outra pessoa do Protocolo dizer que não estava bem ali e colocou-o numa cadeira à parte. Este tipo de situação é provocado pelo facto de o Protocolo de Estado não dizer qual é a sua posição... no protocolo.
De facto, a República Democrática é uma bandalheira, pois, nas cerimónias oficiais, andam com o D. Duarte Pio aos baldões.
Assim, nem o D. Duarte Pio descansa, nem a República se estabiliza e enobrece.