15
Jun06
Distracções
João Madureira
Há festa no bairro. A banda toca modas tradicionais.
O senhor José e a Dona Rosa dançam todos pimpões.
Os meninos querem um gelado, ou pipocas, ou correr e gritar, ou chatear os pais. Tudo ao mesmo tempo. Os pais desesperam. Também querem dançar. Têm saudades dos tempos em que namoravam. Quando tudo ainda era desejo, raiva e ciúme.
Agora estão mais calmos. Pensam nos problemas do dia-a-dia.
A vida de adulto é uma chatice. Só preocupações.
Já nem tempo têm um para o outro.
Os filhos não lhe dão descanso. Só canseiras.
Não se contentam com nada. Quererem tudo.
Tudo o que brilha. Tudo o que mexe. Tudo o que custa dinheiro e só serve para deitar fora passados alguns minutos.
A dona Rosa não se cansa de dançar. Sorri e rodopia. Rodopia e sorri. Depois dá três passos para a frente, dois para trás e um para o lado. Dançar é sempre assim. Mexer os pés e abanar um pouco o corpo.
O Senhor José ainda a consegue seguir com algum brilhantismo. Por isso sorri também.
Os foguetes estouram no ar. Os cães começam a ladrar e as crianças ficam com medo.
De alguma coisa deviam de ter medo.
Agora querem colo. Depois querem ir para o chão. Depois querem correr. Depois querem uma Coca-Cola. E um bolo. E um chupa-chupa. E outro chupa-chupa. E outra vez colo. E outra vez um gelado.
A Dona Rosa continua a puxar pelo senhor José.
O senhor José começa a dar de si, mas disfarça bem.
Mais música, mais foguetório. E os garotos pedem outra vez colo. Agora riem-se muito porque os vêem dançar.
Depois agarram-se a eles e dançam todos juntos.
São uma família. E isso é bom, seja lá porque razão for.