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Jun06
Não quero ser pescado
João Madureira
Por vezes sinto que, mesmo sem querer, ando atrás do anzol do pescador.
É um impulso. Um ligeiro impulso, mas que, no entanto, me perturba.
Há anzóis por todos os lados. A televisão é um anzol. A política é um anzol. As ideologias são grandes anzóis, bem assim como as religiões e o futebol.
O problema é que o anzol está sempre encoberto pelo isco.
Somos constantemente perseguidos pela minhoca, mas é o anzol quem nos mata.
Quando olho para o rio sinto-me triste. Eu até fora da água me afogo. Esbracejo, sopro e esperneio em contacto com o ar.
O sol também me incomoda. Especialmente a sua luz intensa que come as cores.
Gosto de ver as nuvens voar em cima das montanhas.
Os pássaros inquietam-me. Penso que, no seu voo inconstante, podem chocar com as casas, ou com as árvores, ou de encontro às sombras.
O voo ziguezagueante das borboletas aflige-me. Penso sempre que vão cair a qualquer momento.
E os homens quietos nos seus ideais deprimem-me.
Não tenho paz.
Ó perseguidora inquietação, senta-te ao meu lado e desabafa.
Para ti tenho todo o tempo do mundo.