469 - Pérolas e Diamantes: Odontologias
Apesar das boas intenções, há por aí muita gente, dos dois lados do espectro político, que querem acabar com a diferença.
Apesar de se encontrarem no espaço da racionalidade, entraram na psicose do sistema. O politicamente correto está a matar a liberdade de expressão.
A verdade é que a sexualidade e a arte não devem estar à mercê dos programas políticos. E, como diz Camille Paglia, é necessário salvar o feminismo das próprias feministas.
Há que voltar ao essencial, ao período em que as mulheres conquistaram a independência, a autoconfiança e a responsabilidade individual. Pois agora, as feministas pós-modernas só pensam em culpar os outros pelos seus problemas.
Não devemos pedir desculpa por apreciarmos a beleza, pois ela é eterna.
Estamos mergulhados no caos ético, onde a intolerância se disfarça de tolerância e a liberdade individual soçobra sob a tirania do grupo.
A divisão entre esquerda e direita, que se seguiu à Revolução Francesa, já não é o que era, foi ultrapassada, transformando-se numa disputa entre conservadores e liberais.
Os “ismos” passam-me ao lado, capitalismo, comunismo, machismo, feminismo, são ratoeiras para apanhar papalvos. Eu sou humanista, interesso-me pela condição humana. Interesso-me pelos direitos humanos, tanto de brancos como de pretos, tanto de homens como de mulheres, tanto de hetero como de homossexuais. Nunca fui prisioneiro dessas estúpidas distinções.
Uma sociedade inclusiva e autenticamente democrática assenta num corajoso e desassombrado código de responsabilidade pessoal alicerçado a partir de uma aliança inteligente e cautelosa entre homens fortes e mulheres fortes, conscientes dos seus direitos e deveres.
Estou de acordo com Paglia quando defende que o feminismo se deve tornar num movimento onde confluam pessoas com diferentes visões políticas, orientações sexuais e religiosas distintas, procurando fortalecer as mulheres sem necessidade de rebaixar os homens.
Quer queiramos, ou não, o feminismo, na sua intenção de se opor ao machismo, ultrapassou a sua justa missão de procurar a igualdade política para as mulheres recusando, ou obliterando, a sua própria natureza.
Liberdade sexual e libertação sexual são conceitos que se adaptam a todos os gostos e feitios. Mas é bom não esquecer que os seres humanos são animais hierárquicos. Quando abolimos uma hierarquia de imediato outra lhe ocupa o lugar, muitas vezes bem menos agradável do que a primeira.
Como lembra Camille Paglia, a identificação da mulher com a natureza é correta. De facto, o contributo masculino para a procriação é breve e momentâneo. A conceção é um ponto minúsculo no tempo, do qual o homem se afasta reduzido à sua inutilidade.
Para esta professora de humanidades, estudos clássicos, arte e comunicação, estamos a assistir à regressão a um estádio pré-feminista, motivada por uma proteção excessiva às mulheres, definindo-as como seres frágeis e incapazes de se oporem à violência, à discriminação e às adversidades.
Cito: “Se as mulheres desejam liberdade, devem também criar condições para que os homens sejam livres. Os homens que desvalorizam ou subjugam as mulheres não são livres, porque exprimem desse modo o seu medo secreto do poder feminino.”
Cito de novo: “A sexualidade é um reino sombrio de contradição e ambivalência. A mistificação será sempre a companheira desorganizada do amor e da arte. O erotismo é místico, ou seja, é a aura de emoção e de imaginação em torno do sexo. Não pode ser ‘fixado’ por códigos de conveniência social ou moral, sejam eles de esquerda ou direita. Pois o fascismo da natureza é maior do que o de qualquer sociedade.”
E como não há duas sem três, aqui fica a última: “O mito dos índios norte-americanos acerca da vagina com dentes (vagina dentada) é uma transcrição direta e macabra do poder feminino e do medo masculino. Metaforicamente, todas as vaginas possuem dentes secretos, pois o homem sai de lá mais pequeno do que quando entrou.”
Há uma evidência que apela à tolerância das mulheres em relação aos homens. A ironia está na própria natureza. O sucesso sexual termina sempre com o elo masculino na mó de baixo. A proeminência masculina é efémera e tem de ser infinitamente renovada.
Como escreveu Tolstói em “Guerra e Paz”: “Tout comprendre c’est tout pardonner.”