537 - Pérolas e Diamantes: A gesta de Hollywood
A gesta do Faroeste foi uma história inventada por meia dezena de empresários idos da Europa Oriental para os EUA.
Todos esses emigrantes (Warner, Laemmle, Fox, Mayer, Zukor) tinham bom olho para o negócio. Foram eles que construíram os estúdios de Hollywood, a caixinha mágica que fabricou o mito universal com maior êxito do século XX: os filmes do Oeste.
Dizem que os verdadeiros cenários desses filmes eram constituídos por povoações insignificantes onde a única coisa audível eram os bocejos que chegavam a ser mais prolongados do que as pândegas.
Os verdadeiros cowboys, transformados pelos estúdios em taciturnos e viris cavaleiros que atravessavam aquelas terras selvagens resgatando donzelas e libertando as populações da tirania dos bandidos, não passavam de peões mortos de fome, sem companhia feminina, a não ser a das vacas que conduziam através do deserto, arriscando a vida em troca de um pagamento miserável.
E, para que conste, não se pareciam em nada com Gary Cooper ou John Wayne, pois eram negros, mexicanos ou brancos desdentados.
Já os índios, contratados a trabalhar como figurantes no papel de maus terríveis, não eram sequer parecidos com aqueles débeis mentais, pintados e emplumados, que não sabiam falar e ululavam em volta das caravanas crivadas de flechas.
A história diz-nos, por exemplo, que no século XVIII, a colónia de Massachusetts pagava cem libras esterlinas por cada escalpe arrancado a um índio.
Quando os EUA conquistaram a sua independência, os escalpes passaram a ser cotados em dólares.
No século XIX tornou-se famoso um senhor chamado Buffalo Bill por ser o maior esfolador de índios e o grande exterminador dos búfalos que lhe deram fama.
Buffalo Bill, e outros seus congéneres, cometeram a proeza de reduzir cerca de sessenta milhões de búfalos a menos de mil, provocando a morte da grande parte das tribos índias, que tiveram de se render devido à fome.
Sem búfalos para matar, nem índios para escalpar, Buffalo Bill ajudou a fundar o Wild West Circus e passeou-se por esse mundo fora ao ritmo de uma cidade em cada dois dias, onde resgatava diligências acossadas pelos selvagens, cavalgava potros indomáveis e disparava balázios que matavam moscas a grande distância.
Do outro lado sentava-se Touro Sentado.
Touro Sentado teve o seu batismo de fogo aos trinta e dois anos, numa tentativa de defender o seu povo de um ataque de tropas inimigas.
Passados cinco anos, a sua nação indígena elege-o chefe.
Aos quarenta e um anos, em plena batalha, nas margens do rio Yellowstone, caminha firmemente na direção dos soldados e senta-se no chão. Puxa do seu cachimbo e acende-o. As balas silvam ao seu redor. Ele, imóvel, fuma.
Mais tarde foi informado de que os brancos tinham descoberto ouro nas Black Hills, terras pertencentes à reserva Índia, e iniciado a invasão.
Depois, durante uma dança ritual, tem uma visão: milhares de soldados caem do céu como gafanhotos. Durante o sono é-lhe anunciado que o seu povo derrotará o inimigo.
A verdade é que os sioux e os cheyenne, unidos, derrotaram de forma perentória as tropas do general George Custer.
Após alguns altos e baixos, segue-se o exílio e a cadeia. Pressionado, aceita ler um discurso de homenagem ao comboio do Pacífico Norte.
No fim do discurso, coloca os papéis de lado e, encarando o público, profere: “Os brancos são todos ladrões e mentirosos. O intérprete destacado para a ocasião, traduz: “Nós estamos gratos à civilização.”
O público aplaude.
Passado mais algum tempo de decadência, passa a trabalhar no espetáculo de Buffalo Bill.
Na arena do circo, Touro Sentado faz de Touro Sentado, tal como Buffalo Bill faz de Buffalo Bill. A tragédia repete-se como espetáculo.
Aos cinquenta e cinco anos, um sonho premonitório anuncia-lhe: “O teu povo matar-te-á.”
Passados quatro anos, índios, envergando uniformes de polícia, trazem uma ordem de prisão. Ele reage e tomba vítima do tiroteio que se seguiu.