O fim da História: uma narrativa de idiotas
Esta rapaziada que está no governo é toda bem-falante, são bons fazedores de discursos. São, especialmente, especuladores de maus sentimentos e ases no assédio verbal. O primeiro-ministro parece um adolescente fascinado por coca-cola que, com a lata na mão, a agita para depois ver a espuma toda a sair. Parece o maestro de uma orquestra que nos vai matando com os sons dos violinos, dos clarinetes e com o ribombar dos tambores e dos pratos.
Este executivo, cada vez mais se assemelha a uma patrulha de cobradores de impostos dos tempos da Idade Média: espoliam o povo dos seus parcos rendimentos, avisando-o de que tem o direito democrático de pagar e calar. Aos funcionários públicos só falta mesmo castigá-los com um chicote e expô-los atados de pés e mãos no pelourinho.
Temos de reconhecer que toda a confiança e ilusão depositada neste governo de direita neo-neo-liberal se transformou, rapidamente, numa tremenda desilusão e que as suas boas intenções passaram de espetáculo risível a tragédia, que se não é grega anda lá muito perto.
Disseram, esses prestidigitadores neo-neo-liberais, que iam ser a energia cinética do país, fazendo com que Portugal entrasse definitivamente em movimento e assim se mantivesse, para bem de todos. Mas ao que assistimos é a um país que estagnou e começa a andar para trás a uma velocidade preocupante. O desemprego não para de aumentar, a inflação continua a subir, os impostos não cessam de crescer, o PIB vai baixar ainda mais e os vencimentos descem na mesma proporção. Ou seja, todos os indicadores económicos e financeiros se agravaram. Todos sem exceção. Todos. Todos. Todos. E a recessão não cessa de aumentar.
“Diz-me como falas, dir-te-ei quem és”, diz a voz popular. Basta ver como discursa o triunvirato arrogante deste governo (ministros das Finanças, da Economia e PM), para sentirmos que esta gente não discursa, dá golpes verbais de uma arrogância e de um cinismo preocupantes.
O que este pessoal fez é pouco menos do que perverso do ponto de vista económico. Com a história do papão da dívida conseguiram que as pessoas tenham medo de gastar dinheiro. O presidente da Confederação do Comércio, João Vieira Lopes, afirmou que “a seguir ao Natal muitas empresas de retalho vão encerrar porque o Natal não compensará a perda de faturação ocorrida durante o ano”.
É bom lembrar aos mais esquecidos que o senhor PM está a fazer precisamente aquilo que disse que não faria e está a ir ainda mais longe do que a troika lhe pede. E a sua luta é sempre contra os mesmos, que são os bodes expiatórios de todos os males de Portugal: os funcionários públicos e os pensionistas.
Foi este PM, na altura ainda Pedro Passos Coelho, que afirmou ser um enorme disparate a ideia de cortar o subsídio de Natal em 2012. O povo entendeu que o homem queria dizer que o seu caminho não era esse. Mas todos entendemos mal a mensagem: o líder do PSD queria dizer era que a sua ideia ia bastante mais longe, ele pretendia cortar não só o subsídio de Natal, como o subsídio de Férias, e não apenas em 2012, mas também em 2013, e, quem sabe, em 2014, 2015 ou mesmo definitivamente.
Exigia-se a um PM responsável, honesto, solidário e sensível, que entre defender os direitos legítimos do seu povo e os direitos questionáveis dos credores, que nos querem sugar até à última gota de sangue, se pusesse ao lado dos seus concidadãos. O nosso PM devia batalhar ferozmente nas instâncias internacionais no sentido de minimizar os sacrifícios que todos vamos ter de suportar.
Mas não senhor, a criatura apenas consegue ser forte com os fracos e fraco com os fortes. Este governo não tem a menor noção de que com estas medidas está a destruir, com carácter permanente, a frágil teia de relações que sustentam a nossa coesão política e social. O PM português diz que a culpa é da troika. A troika diz que daí lava as suas mãos, como Pilatos. Mas se o Pilatos da troika é leviano, como lhe compete, o nosso é um atrevido intrujão.
Já o principal líder da oposição escolheu o papel de bombo da festa, abstendo-se na votação do orçamento em troca de uma mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma. Além disso, o ministro do logro, das meias palavras e de língua viperina, Miguel Relvas, quando ainda se discutia o decisão do PS, e sabendo que havia muita boa gente na comissão política nacional que defendia o voto contra, levou António José Seguro ao engano garantindo publicamente a possibilidade de uma discussão e de um entendimento sobre a posposta do corte de apenas um mês de subsídio aos funcionários públicos e aos pensionistas.
Mas o bombo da festa, em troca dos elogios bacocos e venenosos por parte do PSD e do CDS, que o apelidam de homem com sentido de Estado, enquanto se riem à socapa, vestiu o seu melhor fatinho e, numa pose de poeta de romance russo, comprometeu-se com um documento iníquo, estúpido, discriminador e patético.
O guião desta série de suspense ainda tem outros traços de mau gosto e péssimo desempenho verbal. Pedro Passos Coelho afirmou que “só vamos sair desta crise empobrecendo”. Está claro que, com esta sua política de destruição do tecido social e económico da nação, tal afirmação é verdadeira, mas o PM, enquanto tal, devia ter cuidado com aquilo que diz. Não há memória de um líder político conseguir mobilizar os seus cidadãos contra a adversidade afirmando que com os seus penosos sacrifícios ainda vão ficar pior do que o que estão. Este homem pode saber o que diz, mas, definitivamente, não sabe aquilo que faz.
O executivo do PSD/CDS recuperou a ideia de Fukuyama: 2012 e 2013 serão os anos do fim da História. Acabaram as ideologias, os direitos políticos e sociais e o desenvolvimento. Agora só nos resta empobrecer.
PS – O PSD e o CDS apregoavam à boca cheia que para sair da crise bastava eliminar as gorduras do Estado. Por isso aconselhava uma cura de emagrecimento. Quando chegou a hora da verdade, e depois de uma procura intensa, a putativa ideia resumiu-se a eliminar os dois subsídios anuais a funcionários públicos e pensionistas. Convenhamos que é de génio.
Estamos em crer que, mesmo assim, o Estado ainda fica com imensa gordura: o mês de férias que pagam ao pessoal, as férias propriamente ditas, os feriados e os fins-de-semana também pagos, o subsídio de refeição, a ADSE e os abonos de família. Isto para não falar no gás e na eletricidade que esses calaceiros gastam nos locais de trabalho, no papel, nas esferográficas, nas cadeiras, mesas, computadores, que podem trocar por máquinas de escrever, nas máquinas de calcular, que podem trocar por ábacos, nas lâmpadas, que podem trocar por velas ou candeias, e mesmo nos carros de serviço que podem trocar por carroças ou mesmo por burros, pois os cavalos são gado caro. E também pôr os polícias e a GNR a fazer as suas patrulhas a penates como no tempo do meu saudoso pai.
Esta rapaziada do Regisconta, que sabe trajar de fato azul, gravata bordeaux, camisa branca e sapato de couro castanho bem engraxado, e que se diz pronta a reformar o país de cabo a rabo, já abriu a caixa de Pandora. Um secretário de Estado, do desporto, creio, aconselhou mesmo os portugueses mais jovens e qualificados a emigrarem.
Até era bem feito que o bom povo português levasse o desafio à letra. Dessa forma ficavam eles, os cobradores de impostos e perseguidores de funcionários públicos e pensionistas, por cá a governarem as vacas, os burros, os porcos e as galinhas, que é para o que têm jeito.
Está visto, este governo não pretende apenas acabar com as gorduras do Estado, deseja acabar com o próprio Estado.