Hoje vou começar pelo fim. Mas não se amofinem porque não é para acabar a crónica antes de a começar. Tal facto tem tudo a ver com o método e nada com o conteúdo.
É que abriu recentemente a “Oficina de Informação Juvenil Transfronteiriça e Local de Ensaio da Eurocidade Chaves-Verín”. Pela extensão do nome somos levados a pensar que deve ser uma coisa fantástica, mas trata-se de um serviço mexeruco que foi instalado no edifício da antiga alfândega de Feces de Abajo. É apenas foguetório.
No entanto, a brincadeira custou a módica quantia de 200 mil euros. E sabem para que serve? Pois para local de ensaio de bandas musicais. Gasta-se uma pipa de massa para arranjar uma sala insonorizada destinada a ensaios de jovens músicos. Lá longe, no meio da terra de ninguém. Bem, na terra de ninguém é uma forma de dizer, pois o local onde a sede foi instalada é território espanhol.
Para a inauguração acorreram de Espanha uns finórios galegos e da parte portuguesa estiveram presentes o Diretor Regional do Instituto Português da Juventude e o vice camarário flaviense, que, ao que tudo indica, já tomou posse efetiva do posto de presidente em exercício do município de Chaves.
João Batista, a crer nas más línguas, já só vai a despacho. Podem dizer-me que a situação é legal e quem sou eu para o desmentir. No entanto considero que tal comportamento é democraticamente inaceitável. Em democracia, e numa república, mesmo que cada vez mais descaraterizada, não há sucessões dinásticas. Muito menos quando elas não foram ainda a votos.
Os mentores do projeto vieram para os jornais afirmar que ele tem por objetivo “servir de plataforma para favorecer e apoiar a mobilidade, a interação e colaboração entre a juventude da Eurocidade; contribuir para a integração e coesão sociocultural da Euroregião e fomentar um espaço para a juventude, que sirva como ponto de referência informativo em temas como empreendedorismo, educação, cultura, lazer, entre outros.” Ou seja, tretas. As tretas do costume.
Vejam como as coisas são, os nossos jovens debatem-se com problemas de acesso ao ensino superior, com situações complicadas a nível da educação formal e da aprendizagem de um ofício, com gravíssimos problemas de emprego e de saídas profissionais e os nossos autarcas, como se fossem de Marte, gastam 200 mil euros para insonorizar uma sala para ensaios de grupos musicais. Isto é a mais pura das insanidades.
Andam a desperdiçar verbas avantajadas em projetos que não interessam a ninguém, a não ser a empreiteiros e políticos. Esbanja-se o dinheiro que tanta falta nos faz em incentivos a políticas ativas de formação e emprego para jovens e ainda se vão gabar disto para os jornais. Mas esta gente pensa que somos todos otários, ou quê?
O alcaide de Verin vai mesmo ao ponto de declarar coisas que só ele é que está em condições objetivas de o fazer: “Ambos os locais (as duas salas do edifício) serão um ponto de referência em matéria de emprego, formação e intercâmbio de experiências musicais destinados a promover a cultura luso-galaica.”
Bem, se o ridículo matasse o senhor tinha saído da cerimónia de inauguração ferido de morte. Então uma sala insonorizada para lá ensaiarem bandas de garagem e outra com um balcão, umas cadeira e algumas mesas cheias de papéis de publicidade municipal, é que vão criar emprego e dar formação aos nossos jovens?
Tretas. Isto não passa de uma enorme mentira, de mais um tremendo embuste, de mais uma falácia pré-eleitoral.
Como a comédia está em andamento, o nosso vice camarário, e atualmente o efetivo presidente em exercício de funções da Câmara de Chaves, António Cabeleira, também entrou no jogo para ver qual dos dois autarcas contava a melhor piada do dia.
Para o senhor arquiteto “apostar na juventude é ter presente e garantir o futuro. A criação deste espaço é extremamente útil para impulsionar o fomento musical, constituindo-se como um espaço de ensaio dos grupos musicais dos dois bairros.”
Na opinião do senhor presidente em exercício de funções, António Cabeleira, uma sala insonorizada, situada em Espanha, onde os dois municípios enterraram 200 mil euros para lá ensaiarem bandas de garagem, é uma aposta para a nossa juventude, porque os nossos jovens do que necessitam é tocar umas músicas que a crise logo passa e o futuro está logo ali ao virar da esquina.
Esta é a prova provada de que os nossos políticos, em geral, e os nossos autarcas, em particular, não sabem o que dizem e muito menos sabem o que fazem. Palram como as aves canoras pensando que nos iludem.
O senhor vereador Cabeleira pode ter só um olho, mas todos sabemos que Chaves não é terra de cegos.
Vossas excelências podem desperdiçar o dinheiro que é de todos em projetos da treta, mas não têm o direito de fazer de nós parvos. E olhem que gastar 200 mil euros para insonorizar uma sala de ensaios é um atentado à sanidade mental dos flavienses.
Os nossos autarcas podem estar doidos varridos, mas estamos em crer que os flavienses ainda sabem bem o que fazem e conseguem perceber quando são burlados.
Para se inteirarem da patetice de algumas iniciativas, basta dar-vos conta de uma. Os dois municípios permitiram a cerca de 50 jovens beneficiar de cursos de língua portuguesa, voltados para a atividade profissional, para, dizem os iluminados, ampliar as possibilidades curriculares dos jovens, mediante a aquisição de competências linguísticas que lhes permitam trabalhar de um ou outro lado da fronteira.
Há qualquer coisa que nos ultrapassa. Então os portugueses aprendem português técnico para irem trabalhar para Espanha? Ou será que o curso é apenas destinado a galegos? E, sendo assim, não era exigível permitir também aos portugueses apender galego? E ainda mais uma questão: Então não é verdade que o galego e o português são línguas irmãs. Melhor seria se pusessem galegos e portugueses a falar, e a escrever, por exemplo, o inglês técnico, que é atualmente a língua que todo o mundo utiliza como ferramenta de trabalho a nível global.
Hilariante, verdadeiramente hilariante, é o facto de os iluminados autarcas de Chaves e Verin terem resolvido unir a Eurocidade transformando a cidade de Verin no seu Bairro Norte e Chaves no seu Bairro Sul. Foi isto o que veio escrito nos jornais.
Mas estes pândegos já anteriormente nos andaram a dar música. Numa tal Assembleia-geral da Rede Ibérica de Entidades Transfronteiriças, realizada em Chaves, tendo ainda como anfitrião João Batista, o presidente demissionário, um tal de Xoán Vázquez Mao, o Secretário-Geral da RIET, disse que “será necessária uma relação cada vez mais estreita entre as entidades transfronteiriças para criarem uma plataforma geral, assim como propostas fundamentadas e ajustadas à realidade”.
Peguem os estimados leitores nas palavras acima transcritas de que maneira pegarem, apenas chegarão à triste conclusão de que o que o senhor disse é nada. Um rotundo e categórico nada.
Mas ainda mais original foi a ideia, também nessa altura apresentada, da criação de uma plataforma de correios ibéricos. Então, quando cada vez menos pessoas utilizam os correios é que se lembram de criar uma rede ibérica? Só se for para dar emprego ao pessoal que elabora os projetos, mas não estamos em crer que algum serviço público ou privado passe a utilizar os correios em tempos da internet. A informação hoje é feita em décimas de segundo. É instantânea. Em que mundo é que esta gente vive? Ou pensarão que Chaves é alguma vila (bairro?) da América Latina?
Pois é, a Eurocidade fez de Chaves um bairro. O que os séculos, as guerras e as invasões não conseguiram, conseguiram-no os presidentes das duas cidades: metamorfosear estas duas localidades ancestrais em bairros de uma cidade com centro em Feces. Gabo-lhes a ousadia, mas eu não vou por aí. Perguntaram, por acaso, apenas por acaso, aos flavienses se estavam de acordo? Qual é o direito, de que se arrogam estes senhores, para nos terem transformado no Bairro Sul de uma Eurocidade inventada pelos tecnocratas de serviço?
Este enorme embuste que dá pelo nome de Eurocidade, além de nos ter transformado num bairro suburbano, cujo núcleo principal é Verin, com sede em Feces, tem sido usado na perfeição para malbaratar dinheiros públicos, para fazer campanha eleitoral nos dois lados da fronteira e tem ainda sido utilizado para dar emprego a gente que mais não faz do que promover os políticos que agora se perfilam para concorrerem às próximas eleições autárquicas. Ora este tipo de atitudes não são aceitáveis num país que se quer afirmar como desenvolvido e democrático. Isto é mais o tipo de técnica utilizada nos países subdesenvolvidos, onde o caciquismo é tolerado, quando não incentivado.
Está visto, esta equipa camarária anda a brincar com coisas sérias. Anda a construir nas costas dos flavienses um embuste que dá pelo nome de Eurocidade. Eu recuso-me determinantemente a ser um Bairro. Eu sou cidadão de uma das mais antigas e nobres cidades portuguesas. Uma coisa é a cooperação com as cidades galegas. Outra bem diferente é a nossa identidade, o nosso orgulho, a nossa história.
Eu recuso-me a entrar neste jogo de brincar às cidades. Era o que mais faltava. Eu sou flaviense, não sou um eurocidadão sem nome nem identidade. Eu sou flaviense, transmontano, nortenho e português. Eu não admito a estes senhores, que agora estão na câmara, que brinquem com os sentimentos mais nobres e mais arreigados da nossa identidade local, regional e nacional.
O dinheiro e a política não justificam tudo. O poder não legitima tudo. A ambição não pode servir para nos amesquinhar. Eu não fui tido nem achado nessa trapalhada da Eurocidade. Nem eu nem os 50 mil flavienses que aqui vivem e trabalham. Está na hora de serem exigidas responsabilidades a quem nos transformou em cidadãos de um bairro de uma cidade que nem nome tem. Com coisas sérias não se brinca. E Chaves é um assunto sério de mais para andarem a fazer com ela experiências saloias.
Chaves merece bem mais respeito de todos quantos têm por missão geri-la. Repito: com coisas sérias não se brinca.
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