Pérolas e diamantes (11): António Cabeleira versus Fernando Campos, ou o problema em busca de solução, ou a solução em busca do problema, ou vice-versa
José Eduardo Martins, ex-deputado e dirigente do PSD disse ao Jornal de Negócios que “os partidos vivem hoje de diretas. E Portugal sempre foi um país de grande caciquismo. Na prática, quem tem força e disponibilidade para organizar o caciquismo acaba por ganhar”.
Mas não é sobre isto que hoje vos quero falar, por isso esqueçam o que anteriormente ficou escrito. Desta vez o que me traz à liça são os sabores de outono, ou melhor, o workshop promovido pelas Termas de Chaves – Spa do Imperador.
De facto, com a chegada do frio temos a nefasta tendência de preferir alimentos mais “aconchegantes”, mas também mais fortes e pesados “abandonando assim algumas das boas práticas adquiridas no verão”, como muito bem nos lembram os simpáticos organizadores do gracioso workshop.
Para evitar ganhar peso torna-se necessário “aprender a preparar refeições equilibradas, saciantes, com recurso aos produtos da época”. Ora, vai daí, preparei-me para ir aos tortulhos. Mas começou a chover tanto, mas tanto, mas mesmo tanto, que não me restou outra hipótese a não ser ficar em casa a ler os jornais da terra.
E pus-me a pensar que cá no nosso torrão nascem candidatos do PSD à câmara como cogumelos. Mas, como todos sabemos, nisto dos cogumelos, os mais coloridos e vistosos são sempre venenosos.
Mas também não é sobre míscaros tóxicos que hoje vos pretendo falar. Mas de coisas bem mais prosaicas. Fernando Campos, presidente da Câmara de Boticas, e dirigente nacional do PSD, depois de ter feito, através de uma sondagem presumivelmente encomendada a uma empresa especializada do Porto, uma primeira investida tentando insinuar-se como suposto candidato à autarquia flaviense, e após ter ensaiado nas redes sociais apresentar-se como candidato efetivo do PSD ao mesmo concelho, já com cartaz e propostas prontas a servir e carregadinhas de demagogia e promessas tipo banha da cobra, resolveu intentar uma terceira investida fazendo-se ao lugar para ver se a ideia pegava, ou se alguém lhe pega. Ou ambas as coisas.
No seu jeito humilde e modesto de barrosão, revelou que tem sido muito pressionado a avançar com a sua candidatura à Câmara de Chaves. Só não disse “quão” muito, nem “quais” os distintos “pressionadores”. Desde logo para não nos impressionar com o seu valor endógeno e exógeno, antropológico, sociológico e ideológico. Sobre isso, apenas reafirmou à “Voz de Chaves” que tem recebido diversas mensagens de apoio encorajando-o a avançar com a candidatura ao município flaviense. E confessou, não os pecados, porque não os tem, mas sim sentir-se “honrado com o desafio”. Estamos em crer que este seu repto tem muito a ver com aquela atitude, agarrai-me se não vou-me ao Cabeleira que o destrono. Mas, enfim, na política o que parece é.
Não se esqueceu de dizer que Chaves é a sua cidade, é o local onde estudou, passou grande parte da sua vida e onde tem os seus melhores amigos. Ora, segundo o “Dicionário dos mais Ilustres Transmontanos”, Fernando Campos nasceu na freguesia de Salto, concelho de Montalegre, e passou a maior parte da sua vida em Boticas. Afirmar que Chaves é a sua cidade pode ser muito simpático para os flavienses, e sentimentalmente verdadeiro para o próprio, mas também é muito capaz de ser uma “boutade” dita para se enfiar no fato curto e apertado de uma candidatura autárquica a uma terra onde a maior parte da população tem dificuldade em aceitar essas suas afirmações como autênticas. E admitir que é em Chaves que tem os seus melhores amigos pode ser uma confissão que muitos dos cidadãos do concelho a que atualmente preside recebam não sem alguma acrimónia. Viver em Boticas, presidir à Câmara de Boticas e ter os seus melhores amigos em Chaves é, muito provavelmente, manifestamente exagerado.
Na sua reconhecida modéstia, e humildade, acredita que a sua experiência autárquica “poderá ser uma mais-valia para dar continuidade ao bom trabalho que tem vindo a ser feito em Chaves”. Ora, deixem lá ver se entendi direito. Afinal Fernando Campos quer vir dar continuidade ao “trabalho que está a ser bem feito”, mandando borda fora um dos obreiros de mais uma “boutade” ficcional, sendo, ainda por cima, seu companheiro de partido. Essa hipótese não lembrava ao demónio, se ainda existisse. Mas lembrou ao senhor autarca. Lá pelo meio da declaração pôs-se com mais uns blablás da defesa dos interesses da região, de reforço de luta e etecetera e tal a que só faltou, para rematar, citar Sá Carneiro. Pois é, até os mais avisados por vezes se olvidam da cartilha.
No final, talvez na sua tirada mais honesta e sentida, disse, e, pensamos nós, sem se rir, que a sua declaração de disponibilidade “não é mais do que isso”, pois quer “apenas fazer parte da solução e nunca parte do problema”. Avisando que só avançará com uma candidatura “se for legitimada pelos órgãos próprios e se reunir um consenso alargado”.
Do que fica dito pelo senhor autarca de Boticas, uma coisa continuamos a não entender. Afinal qual é o problema a que quer dar solução? Se o seu partido tem candidato, se até pertence à concelhia local, se, nas suas próprias palavras, está mesmo a realizar um bom trabalho, quem lhe foi meter na cabeça a ideia peregrina de que por aqui estávamos à espera de um salvador chamado Fernando Campos?
Agora fica visível para todos os flavienses, especialmente para a maioria dos militantes e simpatizantes do PSD, que Fernando Campos não é parte da solução, mas sim parte do problema, pois o que conseguiu foi incendiar as hostes e pôr a correr António Cabeleira caras a Lisboa para, nos órgãos nacionais, ver aprovada oficialmente a sua candidatura à autarquia flaviense.
Mas uma coisa também nós sabemos, Fernando Campos anda nestas coisas da política há muito, mas mesmo muito tempo, por isso não o vemos a protagonizar dois ensaios encapotados e, após esses balões de ensaio, fazer um terceiro intento declarando oficialmente a um jornal cá da terra a sua disponibilidade de concorrer à Câmara de Chaves e, daqui a alguns meses, ir para casa calçar as pantufas e beber vinho dos mortos. Algum trunfo guarda na manga. Alguma intenção terá. E, todos o sabemos, não se fazem declarações tão explícitas sem um objetivo bem definido. Em política tudo o que parece é.
Não tirámos ainda a limpo se o senhor autarca de Boticas será solução para alguma coisa em Chaves. Mas o que sim sabemos, e categoricamente, é que passou a ser o maior problema para António Cabeleira. Daí os escrivas a mando do vice-presidente do PSD flaviense baterem no senhor com muita determinação e arreganho. E com razão, convenhamos, é que Fernando Campos pôs-se mesmo a jeito.
Outra coisa que podemos concluir é que o PSD, como não sente ainda, por parte da oposição, nenhum candidato forte e consistente, dá-se ao luxo de tentar ser ao mesmo tempo poder e oposição.
Também existe a possibilidade, talvez complementar, talvez autónoma, de que a presumível candidatura de Paula Barros pelo PS, esteja a ser encarada tão a sério pelo PSD local e nacional, que para aqui decidiu enviar os pesos pesados para lhe dar luta. A ser assim, tanta temeridade custa a acreditar. Mas em política, tudo o que parece é.
E por hoje é tudo. Para a semana há mais. João Neves aguarda também por umas palavrinhas depois da sua corajosa carta aberta publicada neste jornal. E olhem que bem as merece.
PS – Apelo: Ó senhor presidente, os flavienses já estranham a sua prolongada ausência das cerimónias camarárias e afins, e, por consequência, das fotografias nos jornais. Apareça. Caro presidente, por favor, apareça mesmo que seja muito de vez em quando, pois sentimos a falta do seu sereno e simpático sorriso. Vá lá senhor presidente, não nos abandone antes mesmo de desocupar definitivamente o cargo para que foi eleito. Por favor! O povo que em si votou reclama-o. Por isso faça-lhes, faça-nos, a vontade. Por favor. Por favor, senhor presidente. Olhe que nós sentimos a sua falta, apesar de não o parecer à primeira vista, pois somos homens e mulheres de sentimentos recatados.