O Poema Infinito (120): orientação mortal
Fiquei parado na tua extraordinária insinuação gestual. Nela observei o símbolo de toda a inflexão do esforço e da desordem que preside a todo o pensamento coerente. Toda a ideia pré-existente já foi organizada pelo cânone ocidental das imagens que respiram e se dilatam e se movimentam. E as palavras confessam amor e trazem consigo a perigosa e enigmática pergunta dos amantes. Os campos são percorridos por olhares arbitrários e neles nasce o espírito do destino. As palavras são novas oportunidades para o desastre. E respiram desespero e dilatam-se enquanto se movimentam. Experimentamos de novo o “era uma vez” e a pequena possibilidade de encontrar a verdade em algum deus que exclame oblíquas partículas de tempo e espaço noutra dimensão. Os atores invadem o cinema e destroem todas as imagens. E os realizadores fabricam estios e sussurros e inclinações graves e planos ambíguos e instantes luminosos. E o “the end” vem tão depressa que não possibilita a surpresa da sacralidade das posições sexuais. Só conseguimos observar a pressa da luz e a vivacidade do “pb” e a turbulência íntima dos planos falhados. Por isso o tempo se acautela e desce por nós com a serena destreza do desejo. Os planos multiplicam razões e submissão permitindo que os atores principais se consumam no seu sorriso ingénuo de videntes sem sítio e sem ocasião. Sobre o teu rosto deito o meu rosto. Dentro do teu olhar combinam-se as trevas e o fogo. Por cima das minhas mãos abertas expande-se a energia positiva da luz. E a luz estende-se. Afinal, a ideia é sempre fixa. Imaginamos uma ventania que varre o espaço e que se define dentro da geometria dos sexos. Enchemos o tempo de vazio. E o tempo torna-se ainda mais rápido. E exalta-se. E cai. Umas coisas caem por causa de ver cair as outras. E os nossos olhos enchem-se de mapas abertos que não levam a lado nenhum nem explicam nada. Unicamente sentimos os nossos corpos moldar-se com o ritmo aceso dos relevos. E as linhas de água gravam fendas nos nossos sentimentos repentinos. Uma exaltação táctil expõe-nos à leitura do medo e à ortografia da angústia. Vejo o teu sorriso liso e sinto o frio a bater na orientação mortal da suavidade da noite. Uma sonolência explosiva toma conta de mim. O espaço transforma-se em energia e a energia em delicadeza inútil. As mãos contornam de novo o espaço dos nossos corpos que se agitam na veloz delicadeza dos orgasmos. Continuo a sentir a tua viva ausência mesmo quando estás na minha companhia. A devassidão torna-se um querer que não pretende sair do silêncio. Sempre assim foi. O prazer guardado na arca da mudez. Vou de novo ter medo de adormecer porque me sinto transformar em fotografia incendiada. A verdade queima, o silêncio queima, a leveza pesa e a leviandade examina tudo na sua pose de coração longínquo. As perguntas eternas brilham no entendimento dos olhares. Tu dizes: O amor é uma energia bruta. Eu digo: O amor é uma curva fulminante. Eu penso: Tu és a aplicação determinada de uma dança. Tu pensas: Tu és um pretexto espácio-temporal. Todo o amor aguarda a sua vez na sagrada suspensão do desejo. E o prazer envolve-se em si mesmo. E o universo organiza-se. E os corpos nus transferem-se de imagem para imagem. E bebem-se demonstrando a sua grandeza descontinuada.