Pérolas e diamantes (44): todos estamos a pagar a incompetência
A situação política portuguesa está tão degradada que as pessoas têm a nítida sensação de que já nada interessa. Instalou-se a perversa ideia de que nada muda no essencial. Estamos a enlouquecer coletivamente.
Os políticos que vivem da alternância do poder dizem que esta é a lógica do jogo democrático, que tudo isto faz parte da disfunção do sistema. O problema está no facto de que, nas últimas duas décadas, os políticos que usaram, e abusaram do poder, não possuem um mínimo de vergonha na cara. Conseguem fazer promessas, conseguem não cumpri-las minimamente e ficam impunes como se fossem meninos de coro.
Todos nos damos conta que a alternância democrática não é suficiente. A qualidade política tem-se deteriorado a um ritmo inquietante. A esta gente falta visão do mundo.
Os políticos de hoje foram formados dentro das estruturas partidárias, por isso lhes falta qualidade, cultura, sensibilidade e abrangência. E isto é válido tanto para o PS, como para o PSD, como para o CDS.
Persistem na ideia de que eles é que possuem a verdadeira noção do que é o Estado Social e o Estado de Direito. De facto eles são tudo, porque se instalaram à mesa do poder e nada deixam para a cidadania. Aprisionaram o Estado e a Nação. E, o que é ainda mais grave, aprisionaram-nos dentro da sua lógica.
Paulo Morais, vice-presidente do movimento Transparência e Integridade, afirmou que o maior centro de corrupção em Portugal é a Assembleia da República e que as primeiras filas dos partidos políticos, como o PSD e o CDS, estão repletas de pessoas que são, em muitos casos, membros dos diversos Bancos de Investimento, nomeadamente do BES. Isto é uma coisa que, no mínimo, nos põe em pânico, quando não em desespero.
Todos nos perguntamos por que carga de água é que não nos apercebemos destas evidências. A explicação é simples: existem várias dezenas de comentadores políticos a fazerem as suas análises. Se atentarmos bem, todos eles já foram ministros. São todos dos partidos, sobretudo dos partidos da denominada área da alternância democrática. E isso não é normal.
De facto, eles não comentam política com independência. Eles defendem as teses dos seus partidos. O caso mais escandaloso é protagonizado pelo professor Marcelo (Rebelo de Sousa), que é tão independente, tão independente, tão independente, que até veio a Chaves para apoiar a candidatura da fação minoritária do PSD local, liderada por António Cabeleira. Se o ridículo matasse, dali não saía ninguém vivo.
Se fosse este tipo de gente a escrever o nosso futuro, estávamos definitivamente desgraçados. Mas o futuro, para bem de todos nós, não está escrito em lado nenhum. Somos nós que o vamos construir. Custe o que custar, doa a quem doer.
Para ajuizarmos dos dislates que, por exemplo, se praticam na nossa autarquia, vamos aos factos.
No ponto 4 do “Compromisso” de “Todos por Chaves”, escreve-se que “É tempo de traçar objetivos e de hierarquizar prioridades tendo em conta os recursos disponíveis. Transformar ideias em projetos e projetos em obras.”
Então vamos lá aos projetos e às obras e às prioridades e aos recursos e à hierarquia e às ideias e à transformação. A seguir ao escandaloso aluguer, por 150 €, das antigas instalações do Cineteatro de Chaves, a autarquia flaviense resolveu cometer novo atentado à racionalidade e desbaratar mais dinheiro público. Em ata do dia 18 de março de 2013, relativa ao “projeto de execução das piscinas municipais cobertas de Chaves”, ficámos a saber que a vereação camarária aprovou por unanimidade (lá está o arco do poder, ou o arco dos interesses, leiam como entenderem, a funcionar) a decisão de “promover a revogação do contrato” com a GIPP – Gestão Integrada de Projetos e Planeamento, Lda., e indemnizá-la em 62.181,25 €.
Ou seja, a Câmara de Chaves resolveu retirar dos bolsos dos contribuintes sessenta e dois mil cento e oitenta e um euros e vinte e cinco cêntimos, para pagar uma indemnização por não poder levar a efeito uma obra prometida e já adjudicada.
Sinceramente que não sabemos como estas coisas são possíveis numa instituição pública de interesse comum. Nem sequer nos interessa debater a sua legalidade. O que sim nos importa discutir, e perceber, é a forma como estes atos de gestão ruinosa de uma autarquia são possíveis sem que nada aconteça aos autores de tais dislates.
A política autárquica flaviense tem razões que a própria razão desconhece.
Será?